1. A Grécia teve a pior vitória eleitoral de todos os tempos. A coligação que vai tentar formar Governo não sabe, desde logo, se os gregos querem ficar no euro. O antigo primeiro-ministro Georges Papandreou tinha toda a razão quando pretendeu referendar a continuação na moeda única - mais do que referendar os pacotes da troika. Alguém consegue explicar quantas décadas de sacrifício são necessárias para pagar os investimentos dos Jogos Olímpicos de 2004? E todo o 'monstro' público que ficou vivo nos anos seguintes?... Esta é uma daquelas eleições que se transforma num monumental empate para a evolução da "História".
Corpo do artigo
A Nova Democracia e os socialistas do Pasok são um 'bloco central grego' que não tem maioria absoluta no Parlamento - necessitam de um emergente partido de Esquerda que lhes vai fazer a vida negra com permanentes chantagens. Portanto, a questão essencial é esta: quais são os países/bancos/contribuintes que querem meter mais dezenas (centenas?) de milhões num país que, a este ritmo, vai ter eleições sucessivas até chegar a um caos de nome Syriza? Já toda a gente questionou o facto de poder haver austeridade em democracia. A Grécia é apenas o caso prático desta impossibilidade.
Porque - triste verdade - os gregos não dão um sinal coletivo, prático, de assumirem as reformas que transformem o país. Não é uma questão de austeridade mas de fio condutor para um novo paradigma de país. Claro que não se muda a cultura de uma nação em meia dúzia de meses e imagino o pesadelo de ser-se 'grego-europeu' e conviver com outra Grécia, caótica, ingerível, de baixo nível educacional e péssima organização social e económica. O resto são chavões - a liberdade dos gregos, a sua história, o proveito que alemães e franceses tiraram daquele endividamento colossal sobretudo através de compras militares.
A tragédia destas eleições é a de que pode suscitar uma fratura na própria Europa porque a Alemanha vai deixá-los cair na mesma, apesar da vitória dos partidos da troika. Se tivesse ganho o Syriza, a responsabilidade era deles. Assim, a culpa vai ser da Alemanha. Como se verá, o senhor Hollande vai olhar para o lado, porque também não está com capacidade de pagar a conta... Dir-se-á então que é o fim do espírito europeu. Errado. A questão é apenas e simplesmente outra: porque entraram os gregos na moeda única?
2. Curiosamente, a possibilidade aventada ontem de existirem 750 mil milhões de euros para travar a espiral de juros da economia espanhola e italiana é mais uma medida que separa completamente as águas face à questão grega. É como se o mercado aceitasse que estes dois países vão ser capazes de reciclar a dívida e crescer. Ou seja, há claramente dinheiro para 'salvar' a economia espanhola e italiana se feito num quadro de recuperação positiva, até porque, como se tem visto, há dinheiro a mais e ninguém sabe o que fazer-lhe. Os bancos suíços e alemães estão a pagar 0% ou até a cobrar para deixarem estacionar nos seus cofres um oceano de liquidez. Ora, o que os investidores necessitam é de projetos credíveis para aplicarem capital e terem algum retorno. A Europa é certamente um desses locais do Mundo. Por isso mesmo a Europa tem uma saída - tem capital humano e inovação onde vale a pena arriscar. E até os mercados já perceberam que a economia mundial tem mais a ganhar com a moeda única do que com a sua destruição.
3. E Portugal? Está a fazer o que deve. A proposta de Miguel Cadilhe apresentada terça-feira no Parlamento (um imposto e 4% por cento sobre a riqueza acumulada) é mais um contributo radical e enxuto sobre as diferenças entre capital e trabalho, entre economia e finanças, entre carga fiscal sobre as empresas ou impostos sobre o património. É uma proposta muito mais à Esquerda do que seria de esperar num economista de Direita (ainda que moderado), mas que reforça esse lado da social-democracia que o PSD tende muitas vezes a deixar na gaveta - a justiça social. Será curioso ver como ninguém lhe vai querer pegar: no Governo, porque a ideia não nasceu nas cabeças dos amanuenses locais; na Esquerda, porque não se apoiam as ideias de um antigo ministro de Cavaco. É o Portugal dos pequeninos.