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Um guardanapo de papel pode ter múltiplos usos. Não, não é apenas um utensílio concebido para absorver lágrimas ou limpar os beiços.
Por exemplo: um tipo norte-americano chamado Arthur Laffer lembrou-se um dia de fazer uns desenhitos e inscrever umas curvas num guardanapo para apresentar uma teoria: a de que a partir de um determinado patamar de taxação de impostos, novas tentativas de recolha de receitas são pífias; o intuito forreta é um fiasco. Na altura, em 1974, na tertúlia na qual Laffer apresentou a tese, houve galhofa, e da grossa - Nicolau Copérnico também ousou argumentar com o movimento da Terra em volta do Sol, contestaram-no, e novos estudos científicos acabaram por dar-lhe razão.
A curva desenhada por Laffer fez também o seu caminho. Estudo atrás de estudo, os gurus da Economia analisaram comportamentos durante as últimas décadas e deixaram de ser reticentes: cada 1% de aumento de impostos tem inferior repercussão na receita e, a partir de certo nível, faz um percurso descendente. Não são captadas mais receitas, antes se reduzem, a par da multiplicação da economia paralela.
Os efeitos da curva de Laffer estão, hoje, muitíssimo bem plasmados em Portugal.
O comportamento da execução orçamental nos primeiros sete meses deste ano é elucidativo. O agravamento (insuportável) da carga fiscal sobre os portugueses não significa engorda dos cofres do Estado - nem sequer na área da "perseguição" movida aos consumidores de tabaco! Uma queda a pique no pecúlio de impostos, especialmente do IVA, a par do recuo da atividade económica, traduz-se no já reconhecimento da necessidade de mais sacrifícios para que não fique em xeque definitivo a meta dos 4,5 de défice no final do ano.
Enfim, a carga fiscal caustica os portugueses, fá-los sofrer na pele as consequências de políticas de todo em todo recessivas. Engrossa o batalhão de desempregados e de empresas a correr os taipais todos os dias. Um desastre!
Perante um bê-á-bá assim, impressiona a ligeireza - ou cegueira? - com que o Governo alinha, obediente, nos parâmetros consagrados como condição para o apoio financeiro internacional ao contorno de uma bancarrota certa do país.
Chegados a um ponto de calamidade de proporções tão avantajadas, só resta uma alternativa de explicação para a continuidade do atual modelo de governação segundo as recomendações dos credores: é desejado o empobrecimento de Portugal.
Uma tal conclusão, nua e crua, carece no entanto da existência de franqueza para a anunciar. E nunca como agora foi preciso colocar tudo em pratos limpos.
Não existindo inversão nas políticas, haja quem ponha fim a cortinas de fumo e prepare os portugueses para se assoarem ao guardanapo de mais pobreza nos próximos (longos) anos. A mentira tem perna curta.