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Pela terceira vez em dez edições, Eduardo Souto Moura venceu o Prémio Secil Arquitectura, agora graças ao edifício da Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais. Foi o primeiro arquitecto a receber a distinção, em 1992, pela Casa das Artes do Porto, e em 2004 voltou a ganhá-la, pelo Estádio Municipal de Braga. Este é um bom ano para o arquitecto, que recebeu o Prémio Pritzker no passado mês de Junho em Washington.
A arquitectura portuguesa tem sido reconhecida no mundo nas últimas décadas, com destaque para Álvaro Siza e Souto Moura, ambos da famosa Escola do Porto que Carlos Ramos pôs de pé. Mas, no fundo, temos com ela a mesma relação de amor e desdém com que tratamos outros tesouros nossos. Como quando a selecção nacional de futebol está em alta e o português, de bandeira à janela, grita frases históricas do tipo "até os comemos!", mas no dia seguinte arrasa treinador e jogadores porque sofreram uma derrota.
Ontem foi noticiado o prémio George Winter (a grande distinção europeia no âmbito dos biomateriais) do biólogo Rui L. Reis, da Universidade do Minho, e soube-se que um financiamento de um milhão de euros foi atribuído ao matemático português André Neves, do Imperial College de Londres. Anteontem, falou-se dos mais de 50 planetas fora do sistema solar descobertos pela equipa do astrónomo da Universidade do Porto Nuno Santos.
Notícias como estas deviam fazer-nos sentir gratos pelo investimento feito no ensino superior e na investigação científica nos anos recentes. São frutos de uma estratégia política que não dependeu de ciclos eleitorais e que é, mesmo em tempo de crise, essencial para o país ser mais do que um produtor de futebolistas, por muito fabulosos que sejam.
Trabalho e obstinação, criatividade e capacidade de correr riscos, abertura perante a novidade e uma pedagogia inovadora - tudo isto envolvido numa visão inteligente - são as raízes do que floresceu na Escola de Arquitectura do Porto. É claro que Álvaro Siza e Souto Moura seriam sempre bons, mesmo que formados numa escola menos acolhedora, mas é bom sabermos que começaram ali.
A Casa das Histórias que Souto Moura tão extraordinariamente concebeu para guardar e mostrar o trabalho da pintora Paula Rego temà entrada uma caixa de esmolas feita pela própria artista.
É que todos gostamos de saber que o nosso arquitecto e a nossa pintora recebem prémios, cá como lá fora, mas quando chega a hora de arranjar dinheiro para manter a casa em funcionamento ninguém quer pagar a conta. Nem mesmo quem gostou de aparecer na fotografia da inauguração.