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As férias em família são momentos de encontros e lembranças, sobretudo quando nos sentamos com os mais velhos para ouvir as suas histórias. Este ano, recebi uma memória lindíssima da minha avó, que viveu numa aldeia de Castro Daire.
A minha mãe recordou-me que a avó teve uma missão especial: era quem lia e escrevia as cartas de muitas pessoas. A sua casa era um ponto de encontro de mulheres que vinham de longe, muitas a pé, atravessando montes e vales do Paiva, trazendo nas mãos um envelope com o peso do mundo. Essas mulheres, de coração apertado, esperavam ouvir boas notícias dos maridos, irmãos ou namorados que a guerra lhes tinha levado. A minha avó, quase a única da aldeia que sabia ler e escrever, tornava-se a ponte entre o silêncio e a esperança.
Nem sempre as cartas traziam palavras felizes. Muitas vezes, as novidades eram duras e cheias de dor. Contava-me a minha mãe que, nesses momentos, a avó lia devagar, soletrando cada sílaba, como quem procura no tempo um pouco mais de alívio antes de deixar cair a notícia. E depois, com sensibilidade, ajudava a construir a resposta: sempre carregada de amor, força e resistência.
Hoje, num mundo em que as notícias chegam ao segundo, é quase impossível imaginar o peso de cada carta, de cada palavra. Mas é precisamente por isso que me enternece tanto esta memória: porque mostra como o amor e a solidariedade humana, mesmo em tempos difíceis, sempre encontraram caminhos.