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Tive uma reunião com a dinâmica Associação de Mulheres com Patologia Mamária, que se juntou ao coro de preocupações com o Centro Hospitalar do Barreiro-Montijo (CHBM). E não é só na área da oncologia. Evidencia-se uma estratégia de transformar o CHBM num hospital de mera retaguarda, afastando recursos das populações locais, com prejuízo da acessibilidade e qualidade dos cuidados prestados.
De 2010 a 2014, os custos operacionais do CHBM diminuíram de 91,2 para 75,3 milhões de euros. Uma redução em 17,4% na despesa anual pode ser devida a algumas poupanças virtuosas, nem se discute, mas tem inevitáveis consequências negativas, com cortes dramáticos no investimento, não renovação do parque tecnológico e não contratação de recursos humanos. Algumas estatísticas quantitativas assistenciais parecem melhorar, mas sem uma auditoria independente não se sabe a que correspondem exatamente.
A verdade é que o CHBM tem 100 camas encerradas que poderiam ser colocadas ao serviço da população e é notória a situação de falência de alguns aparelhos, que não são atualizados e cujo período de vida útil há muito ultrapassou os limites de funcionamento.
Um doente disse que as urgências do Barreiro pareciam um "hospital de campanha em tempo de guerra", com um grave défice de médicos, enfermeiros e outros profissionais, situação agravada pela presença de doentes psiquiátricos na urgência geral durante a noite, por vezes com graves distúrbios.
A fama negativa do Conselho de Administração (CA) afasta médicos dos concursos, que ficam tendencialmente desertos. Por exemplo, este hospital tinha quatro dermatologistas e agora só tem um e apenas em tempo parcial.
Uma médica oncologista esteve três meses à espera de um contrato, que nunca veio, mas em 15 dias foi contratada pelo Hospital de Setúbal. São ambos hospitais do SNS, o que demonstra a falta de vontade do CA do CHBM em contratar a médica e apostar na Oncologia. A Oncologia dá despesa... Por isso alguns doentes perdem os tempos do tratamento oncológico, com óbvias consequências para o seu prognóstico, o que é gravíssimo.
Esta é precisamente uma das razões do pedido de demissão do diretor da Oncologia, que na carta que escreveu ao CA, entre outras afirmações preocupantes, escreveu: "Porque considero não ser possível, nas atuais circunstâncias, desenvolver a prática da Oncologia no Centro Hospitalar nas suas várias dimensões, quer organizativas quer no que respeita à qualidade clínica e formativa, acompanhando o estado da arte e em condições que lhe garantam a credibilidade e a idoneidade", e ainda que "pelo contrário, o que se tem registado é a perda de competências e de capacidades e o aumento dos constrangimentos no acesso a cuidados".
Há hospitais cujos problemas só se resolvem com a substituição do CA, nomeando gente que se preocupe mais com as pessoas.
BASTONÁRIO DA ORDEM DOS MÉDICOS