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Observando com atenção o desempenho dos principais atores políticos em Portugal, percebemos que, em cima da profunda crise que atravessamos, há um gravíssimo problema de comunicação que tem na folha rabiscada que o ministro da Presidência distraidamente evidenciou anteontem no Parlamento a partir da bancada do Governo uma interessantíssima imagem da realidade: a de um imenso pântano. Os próximos tempos ameaçam tornar tudo bem pior.
Quando no início da semana o Governo cair, as diferentes bancadas do Parlamento ensaiarão o tom a adotar em campanha eleitoral cujo início se marcará ali, diante de um executivo que se submete a uma espécie de morte súbita, talvez convencido de uma outra vida dali a menos de dois meses. É pelo menos essa a convicção de ministros, como os da Economia e dos Negócios Estrangeiros, que já falaram de uma merecida compensação de votos. Não será assim tão linear essa linha evolutiva cujo traçado será, decerto, feito em ziguezagues. Com desfecho imprevisível.
Atendendo àquilo que os média noticiaram nas últimas semanas, prevê-se que haverá mais revelações resultantes de uma noticiabilidade alimentada por fontes de informação com elevado conhecimento de dossiers quentes para este Governo, sobretudo envolvendo a vida do primeiro-ministro. Ora, num contexto de crise como este, exige-se que os atores políticos sejam capazes de responder com uma bem urdida estratégia de comunicação. Não tem sido, de todo, assim.
Tendo considerado o demissionário secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território imprudente quando constituiu duas empresas imobiliárias, o primeiro-ministro deveria ter tido mais cautela quando se confrontou com a primeira manchete do “Correio da Manhã” dando conta da sua empresa familiar. Em vez de julgar o assunto fechado com uns sucintos esclarecimentos, deveria ter gizado um cuidadoso plano de comunicação que o retirasse do olho do furacão. Para isso, deveria ter tido tempo para refletir bem no impacto de tal notícia e reservar tempo para dar as explicações necessárias.
Acompanhando este ambiente deslizante, o presidente da República também não tem acautelado o seu lugar. No sábado à noite, veio ao Palácio de Belém para ver, pela TV, a comunicação do PM e regressou depois para o seu descanso, melindrado por não ter sido previamente informado do que estava ali a ser dito. E confessou isso aos jornalistas, quando o mais avisado deveria ter sido remeter-se ao silêncio.
Nos próximos dois meses, prevê o pior. E, quando chegar o dia das eleições, o resultado pode ditar uma composição do Parlamento incapaz de gerar uma solução governativa estável. Isso seria devastador para o país.