Um relance pelo mapa da União Europeia revela uma enorme disparidade no que à fiscalidade empresarial diz respeito. Na senda da Irlanda, vários países têm procurado usar o IRC como um instrumento na captação de investimento estrangeiro e atracção das sedes das maiores empresas. Engano--me a escrever "domínio" e o corrector, pressuroso, substitui a palavra por dominó. Curioso. É uma leitura possível: um após outro, os países têm vindo a ajustar a sua fiscalidade, levando a um nivelamento por baixo. Talvez não tivesse de ser assim. Qualquer que seja a nossa opinião, esta é uma situação que não mudará de um dia para o outro e não admite ingenuidades. Se a questão fiscal influencia a escolha da localização das empresas e investimentos, há que perceber como estamos posicionados nesse campeonato. As análises são unânimes: estamos mal. Taxas elevadas, leis complexas e em permanente mutação, estimulando a fuga e originando conflitualidade. Tudo o contrário do que as empresas procuram: previsibilidade e eficiência. Os inquéritos a potenciais investidores revelam-no. Sendo consensual que, sem estimularmos o investimento e atrairmos investimento estrangeiro, a reconversão empresarial e a recuperação do emprego não ocorrerão ao ritmo de que necessitamos, esta é uma matéria em que deveria ser possível construir um acordo alargado.
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Ainda não tive tempo de estudar a proposta da Comissão para a Reforma do IRC. O que vi deu para perceber que tentou ser transparente quanto a algumas consequências, no imediato, da redução das taxas, não embarcando na teoria fácil, e falsa, tão do agrado de alguns nossos empresários, de que a redução dos impostos sobre as empresas acabaria por se traduzir num aumento de receitas. Erro crasso! Por cá, ser honesto nestas coisas da política e das políticas é tão pouco habitual, que se paga caro.
A ligação de Lobo Xavier a algumas grandes empresas portuguesas está a ser usada para acusar a Comissão de ser agente dos interesses do grande capital, fazendo renascer a velha dicotomia grandes empresas/PME. Seja em que domínio for, será sempre difícil colocar a discussão num nível útil enquanto os nossos críticos de serviço se pautarem por um comportamento oportunista e um pensamento a preto e branco, que é uma declinação primária da ideologia da luta de classes. Os mesmos que, nos dias pares, clamam pela necessidade de termos empresas capazes de enfrentar as grandes corporações internacionais, ressuscitam, nos dias ímpares, o clamor contra as nossas poucas grandes empresas. Justificam-se, aqui, duas ou três verdades "lapalicianas". Primeira: a questão crítica não é a da dimensão mas a da capacidade de competir ou, em linguagem mais comum, o das boas e más empresas. Segunda: entre nós, mais de 75% das empresas não pagam IRC - menos de 5% das empresas são responsáveis por mais de 80% da receita. Se a taxa baixar, só as que pagam é que podem beneficiar. E se forem as grandes a pagar......
Numa matéria tão relevante, é decisivo que se procure recentrar a discussão no que realmente releva. No caso do IRC, a taxa é importante mas, como Lobo Xavier já salientou em mais de uma ocasião, fundamental mesmo será a garantia de estabilidade legislativa, a sua clareza e a simplificação de processos. As empresas são avessas a um aumento injustificado de incerteza. Já lhes basta a que decorre do ambiente globalizado, em que vivem e competem, para ser necessário o Estado introduzir mais alguma. O consenso interpartidário tem aqui aplicação privilegiada. Adicionalmente, a clareza e a simplificação evitarão a proliferação de acções contenciosas que, na sua maioria, acabam por ser desfavoráveis ao Estado e nas quais se consomem recursos para os quais existem aplicações bem mais úteis.
As contas que a Comissão fez são para os anos mais próximos. Diz-se que a troika quer compensações que, já se especula, incidirão sobre o trabalho ou o consumo, o que seria trágico para a estabilidade social e alguma recuperação da procura interna. O acordo alargado reforçaria, por certo, a capacidade negocial junto dos credores. Se tudo isto não o torna um imperativo......