Regularmente, surgem estudos que dão conta da importância de alguns sectores de actividade. Se tomarmos uma dúzia desses trabalhos, e aceitarmos o que lá se diz sobre o respectivo contributo para o produto nacional, teremos uma surpresa: tudo somado dará mais de 100% do PIB! Não, não é a economia subterrânea que, assim, fica às claras. Para não complicar muito as coisas, direi que cada sector tem dois pesos e duas medidas: atribui ao próprio toda a actividade, mesmo que diversificada, das empresas que se dizem desse sector. E soma-lhes, ainda, as eventuais ramificações que existam noutros sectores. Como estes, por sua vez, fazem o mesmo, o resultado está à vista!
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Recentemente, também as chamadas indústrias criativas entraram neste jogo.Com um âmbito que pode ir da publicidade à música, passando pelo design, software, cinema, rádio e televisão, reclama, para si, um peso muito superior, por exemplo, ao da indústria automóvel. Os mais cépticos responderão, não sem razão, que não se vive "dessas coisas" e que muitas das actividades listadas são determinadas por outras. A resposta óbvia é que, também, não se vive sem "essas coisas" e que, frequentemente, são elas a puxar as outras. Não é este o espaço para essa discussão. Mais importante será apontar casos concretos e lembrar, por exemplo, que a dinamização ou reabilitação dos centros urbanos de cidades como Barcelona, Glasgow ou Sheffield passou por uma política para essas indústrias. Ou recordar como associamos certo design aos países nórdicos. Ou o cinema a Hollywood e, mais recentemente, Bollywood (e como a Índia tem aproveitado para melhorar a sua imagem). Ou sublinhar o papel de Bjork na divulgação da Islândia ou o dos U2 e da música, em geral, na promoção da Irlanda.
Obviamente, nada disto acontece por acaso. Exigem-se políticas e acções consistentes. E que não se caia no modismo de ver nas actividades criativas a tábua de salvação.
Enquanto isso, há quem vá fazendo o seu trabalho. Como é o caso do quase trintão Fantasporto que, ano após ano, consolida a sua reputação internacional, sendo capaz de atrair nomes de relevo da indústria cinematográfica. Não atrairá muitos turistas. Traz filmes de qualidade e contribui para a divulgação da imagem do Porto, e de Portugal, entre certos círculos de influência, o que não é, de todo, despiciendo.
Ainda na área do Porto, a Orquestra de Jazz de Matosinhos tem visto a sua reputação subir, mesmo no plano internacional. Recentemente, completou, com assinalável sucesso, um ciclo de espectáculos em Nova Iorque, associada a uma das lendas do jazz, Lee Konitz, com quem já havia gravado o excelente Portology.
Por fim, talvez o caso mais extraordinário: os Buraka Som Sistema. Com origem no difícil contexto da periferia de Lisboa, evidencia como as artes podem ser uma alternativa de integração. Além disso, justifica uma atenção especial pela qualidade do próprio projecto musical, que tem obtido justo reconhecimento internacional. Ao ponto de o insuspeito "Financial Times" lhes ter dedicado uma crónica, aquando da sua actuação em Londres, tendo-lhes atribuído cinco estrelas!
Como diz Conductor, músico dos Buraka, "Portugal não é só tristeza e lamento". Afinal, há vida para além da crise!