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A transformação digital da "máquina" da Administração Pública (AP) constitui um dos principais desafios desta década, no quadro das oportunidades únicas proporcionadas pela evolução galopante do "digital" em todo o Mundo, potenciadas, no nosso caso, pela bazuca do PRR e pelos restantes financiamentos europeus ainda a fluir para Portugal.
Curiosamente, ou melhor, tristemente, não vislumbrei ainda a formulação clara, coerente e consistente, de uma visão do que se pretende que venha a ser a AP Digital em 2030! Nem tive acesso a nenhum documento que estabelecesse uma estratégia de atuação, desdobrada em ações verticais, horizontais e setoriais, com objetivos claros e quantificáveis, que, a serem concretizadas de forma articulada, produzissem as desejadas transformações, melhorando a prestação dos serviços da AP aos cidadãos e às empresas, com mais eficácia, eficiência e qualidade que atualmente.
A transformação digital da AP envolve pessoas, tecnologias, processos de trabalho, competência e liderança. Ao iniciar-se uma campanha eleitoral e um novo ciclo governativo, não seria demais EXIGIR aos candidatos e aos partidos que explicitem a sua estratégia e objetivos concretos para a transformação digital da AP e para o uso competente e eficaz dos muitos fundos que irão estar disponíveis para o efeito.
No plano tecnológico, a infraestruturação do "digital" da AP exige uma abordagem sistémica muito diferente da atual, privilegiando por um lado o potencial do efeito de escala resultante da agregação das necessidades em termos de equipamentos, redes, armazenamento em nuvem, centros de dados, recursos humanos especializados e aplicações e serviços comuns. E por outro lado, preservar a capacidade de responder atempadamente e competentemente às necessidades específicas e locais dos organismos e serviços da AP.
Para tal há que operacionalizar uma nova arquitetura de governação e de operação das Tecnologias e Sistemas de Informação da AP, capitalizando nas aprendizagens já adquiridas no presente - e muito já se fez bem feito - e acrescentando capacidades de comando e controlo sistémico que permitam tirar partido do todo, sem esmagar as partes.
É possível nós, portugueses, fazermos isto! A demonstração foi feita recentemente pela equipa da vacinação comandada pelo vice-almirante Gouveia e Melo.
É preciso é querermos mesmo! Fica aqui a mensagem para o futuro primeiro-ministro.
*Professor catedrático distinto jubilado do IST e fundador e investigador emérito do INESC
