Concorde-se, ou não, com as suas linhas gerais - e só essas são conhecidas no momento em que escrevo - há que dizer que o PEC apresentado pelo Governo português é um trabalho bem feito, se avaliado na perspectiva dos seus destinatários externos. Foi bem recebido pelos mercados e pela generalidade das instituições e agências internacionais. Num país tão endividado, é bom que tal tenha sucedido, evitando o agravamento das condições de crédito.
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O ministro das Finanças estudou bem a lição. Os restantes desapareceram ainda antes do combate. Recordemos que o programa se chama de estabilidade e crescimento. As finanças fizeram a sua parte: a estabilidade. Controlam a evolução da despesa. Aumentam a receita, agravando a carga fiscal. Reduzir o défice, congelar a dívida. Estabilidade. E o crescimento? Anémico. Pudera! O receituário é o imposto pelas instituições internacionais: o equilíbrio orçamental é o pressuposto para o crescimento. Como se as duas coisas pudessem ser compartimentadas no tempo e se sucedessem mecanicamente. Concedamos: na ausência de uma estratégia credível e à míngua de reputação internacional, com os mercados nervosos, talvez não possa deixar de ser assim. E depois? Admitamos que conseguimos trazer o défice para os 3%. O que acontecerá a seguir? Pressente-se alguma estratégia, para além da dimensão financeira? Não a havendo, mais ano menos ano, voltaremos ao mesmo.
Infelizmente, o que está anunciado, ou implícito, no PEC ou é mais do mesmo ou é demasiado pouco. Como quando se anunciam adiamentos nos TGV (quem disse que tinha de ser TGV?) Porto-Lisboa ou Porto-Vigo por ainda não estarem adjudicados, mas não se aplica o mesmo critério nem à 3.ª travessia do Tejo nem ao novo aeroporto de Lisboa. Não é isso, porém, o mais importante. Importam-se de explicar o modelo económico para o país, sublinho "para o país", implícito na concentração de investimentos à volta da capital? Talvez tenham razão. Mas expliquem, explicitem. Para ver se a gente entende. Não é possível mobilizar os agentes económicos e sociais para uma estratégia que não se percebe. E aquilo que se percebe não mobiliza ninguém. E, já agora, façam as contas todas para ver se batem certo. Saem dois funcionários, entra um. Reduz-se a Administração Pública. Muito bem. Diminuem as deduções fiscais em Saúde e Educação. Tudo bem. Mas isso não aumentará a procura pela oferta estatal, tendencialmente gratuita para o utilizador? Se sim, a não ser que haja espaço para muitos ganhos de produtividade ou se esteja disposto a deixar degradar a qualidade do serviço, é preciso mais gente nesses sectores. Não por acaso, dois dos que mais pesam na despesa pública. Quanto custará? Qual o saldo final? Fizeram as contas todas?