1 Um destes dias, o chefe Anthony Bourdain fez no seu programa televisivo um roteiro da reanimação dos tradicionais bistrots parisienses, movimento liderado por alguns jovens chefes, promotores de uma cozinha baseada em ingredientes frescos e naturais, à revelia da lógica das estrelas Michelin. A comida seria excelente, os espaços agradáveis mas não sofisticados e a lógica comercial óbvia: quase sempre um menu fixo que permitia reduzir os custos a um mínimo. E aí veio a surpresa: os preços anunciados eram, em geral, inferiores àqueles que se praticam nas novas tascas lisboetas. Tenho a intuição, mas só isso, que, após a adesão ao euro, houve na restauração uma acentuada subida do preço médio das refeições. Dir-se-á que apareceram restaurantes de melhor qualidade. É verdade. Que sendo um sector concorrencial, não pode haver concertação de preços. É certo. Neste contexto, é provável que a restauração seja apenas um reflexo de um mal mais geral: a ilusão da prosperidade fomentou uma procura sem um sustentáculo na economia do país o que, por sua vez, suscitou um conjunto de consequências que vão desde o preço excessivo do imobiliário até à subsistência de empresas pouco eficientes que, na conjuntura que se vivia, puderam repercutir a sua incapacidade organizativa numa subida de preços. Se este fosse caso único, não viria daí grande mal. O pior é que esta lógica se generalizou fazendo subir o custo de vida, aumentando o endividamento de empresas e famílias e fomentando as importações. A austeridade reintroduziu alguma racionalidade nisto tudo. As famílias cortam no consumo, as importações diminuem. Mas há uma velha lei que diz que pelo menos parte do efeito pode ser contrariado com a descida de preços. Não estamos habituados, mas é lógico. As corporações vão resistir - afinal, a generalidade das empresas estão apenas habituadas a repercutir aumentos dos custos de factores no preço final, quantas vezes desproporcionalmente. Talvez a recessão seja a ocasião para aprenderem algo sobre o mercado.
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2 Falar de incentivos fiscais é hoje quase crime: o Governo não tem margem de manobra, dizem. Generalizado, é um raciocínio perigoso. Dou um exemplo. A reabilitação urbana é uma área consensual, podendo a sua dinamização ajudar um conjunto de PME em dificuldade, garantindo uma grande incorporação de valor acrescentado nacional e tendo efeitos indirectos significativos noutras actividades, como o turismo. Percebe-se, por isso, mal que a nova lei das rendas não crie um estímulo especial à recuperação de prédios degradados. O mercado, só por si, não resolve tudo. Pode mesmo piorar: limitar-se a liberalizar as rendas não é, neste caso, o incentivo certo. O Governo não tem margem para abdicar de receita? Um equívoco: se nada for feito, então sim, não haverá nem crescimento, nem emprego, nem receita. Não se pode perder o que não se tem. Não é assim?
3)Na mesma linha, e ainda na reabilitação urbana, cria perplexidade a renitência do Governo em pagar o que deve à SRU do Porto. Ou talvez não. No domínio do território, a confusão é grande. Muita agitação e pouca substância. Talvez uma cortina de fumo, para esconder intentos mais profundos de que a entrevista do director de um recém-criado Instituto do Território pode ser o rabo de fora quando afirma que as comissões de Coordenação Regional são, hoje, um obstáculo ao desenvolvimento. Raciocínio parece que subscrito por Santana Lopes. Que edifício administrativo descentralizado estarão a congeminar? Para uma discussão mais fundamentada, recomendo a leitura do post "É sensato escolher bem os afilhados" de António Figueiredo no blog Interesse Privado, Acção Pública.
4)Quanto vale a manutenção do regime democrático, num dos seus membros, para o directório europeu? Quem tolera o que se passa na Hungria e empurra a Grécia para soluções extremistas, não andará a brincar de aprendiz de feiticeiro?
5)Questão de Carnaval: se o Porto despedisse o treinador, haveria alguma equipa da 1.ª Liga que o quisesse?