Ir para a escola de carro ainda é o mais viável. Por várias razões
Quem vive em locais sem uma rede eficaz de transporte público é obrigado a recorrer no seu quotidiano à viatura própria que se converte assim num bem essencial.
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Por isso, quando os Censos mostram que metade das crianças dos 6 aos 18 anos vai de carro para a escola, muitos de nós não se surpreendem.
Pertenço ao grupo daqueles que todos os dias levam os filhos à escola de carro. Por várias razões. Porque ao início da manhã esse itinerário prolonga-se depois até ao meu local de trabalho e vice-versa ao final do dia, não havendo para esses percursos oferta de transporte público compatível com os horários a cumprir. E porque connosco levamos mochilas impossíveis de transportar a pé.
Imaginemos um dia normal de aulas de um qualquer ciclo do Ensino Básico. Por norma, há, pelo menos, cinco tempos letivos, ou seja, cinco disciplinas. Cada uma tem um manual, um livro de exercícios e um caderno de apontamentos. Isto implica meter numa mochila uma dúzia de livros. Se houver aulas de Educação Musical ou Visual, a carga alivia, mas se o dia for de Educação Física acrescenta-se outro saco para o equipamento. Será possível transportar tudo isto a pé ou fazer percursos que impliquem mudanças de transporte?
Na leitura explicativa dos Censos, alguns especialistas apontaram questões de segurança para explicar o uso do carro nestes contextos. Poderá ser uma variável a considerar, quando a residência é mais isolada, mas em zonas de densidade populacional média não será esta uma razão a invocar, porque nas imediações das escolas há sempre muita gente em circulação. Também há quem fale numa geração de progenitores demasiado protetora dos filhos, que encontra no carro uma espécie de casulo que se quer em extensão com o estabelecimento escolar. Não é uma observação muita assertiva. Basta observar os movimentos dos mais novos no intervalo do almoço para se perceber o grau de liberdade que muitos têm para fazer refeições de forma autónoma em cafés ou restaurantes.
Há, pois, que recentrar a questão no essencial, que, neste caso, pode ser declinada em três andamentos: hábitos demasiado enraizados no uso da viatura individual, uma rede de transporte público nem sempre alinhada com as necessidades da população e um sistema escolar que sobrecarrega cada vez mais as mochilas das crianças. Se o primeiro traço leva muito tempo a corrigir e o segundo exige muito investimento, talvez fosse acertado começar a discutir os livros e cadernos que as nossas crianças levam diariamente para a escola.
Prof. associada com agregação da UMinho