A análise das propostas programáticas apresentadas pelos principais partidos revela-nos que, apesar das suas diferenças, reconhecem que é necessário melhorar as condições de vida dos portugueses, o que implica a melhoria dos seus rendimentos disponíveis através, por exemplo, do alívio da carga fiscal, da reposição de salários cortados, etc. Qualquer que seja o Governo que venha a ser formado, os portugueses têm a legítima expectativa de que essa melhoria ocorrerá.
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Este facto representará uma clara inflexão face à política que foi defendida e seguida pelo ainda atual Governo. Uma política restritiva que reduziu rendimentos ora através de cortes salariais, ora através do aumento de impostos. Uma restrição que provocou, entre 2011 e 2013, uma contração de 14% da procura interna (o consumo e o investimento), arrastando a economia para uma recessão durante três anos. Em 2015, no primeiro e segundo trimestres, a economia cresceu 1,5%. Mais uma vez, foi a procura interna a influenciar o ritmo de crescimento económico. Esta inflexão vai certamente impulsionar a procura interna e contribuirá, portanto, para o fortalecimento do crescimento, num quadro em que, face à desaceleração da economia mundial, as exportações poderão vir a ter um contributo mais modesto. Melhorar o crescimento é vital para gerar mais emprego e mais riqueza, permitindo ao país - Estado, empresas e famílias - enfrentar melhor as suas responsabilidades financeiras face aos seus credores.
Será que, no quadro exigente de regras orçamentais que regem a Área do Euro, existe espaço de manobra - na gíria técnica, espaço orçamental - para implementar aquelas medidas? O país está em situação de défice excessivo e tem que o reduzir para um valor inferior a 3% do PIB. Mas, feito isto, por exigência do Tratado Orçamental, terá que continuar a reduzi-lo até atingir uma situação próxima do equilíbrio. Será possível respeitar estas regras e ao mesmo tempo cumprir as promessas eleitorais? A Comissão Europeia já adiantou uma interpretação flexível destas regras que possibilitará aliviar o ritmo de redução do défice, mas só após o país deixar de estar com défice excessivo. Esperávamos que, no fim deste ano, isso acontecesse, mas, conforme alertei na semana passada, há dúvidas que assim seja.
Se, entretanto, o Governo não arranjar forma de pôr fim ao défice excessivo, o espaço orçamental do próximo Governo ficará limitado. O futuro primeiro-ministro encontrará no falhanço do atual uma das maiores dificuldades para a sua governação. Acontece que o futuro primeiro-ministro pode muito bem vir a ser o atual. Irónico, não é?