Se há coisa de que gostamos é de portugueses pelo Mundo. O nosso patriótico coração explode de orgulho quando sabemos que há um compatriota em lugar de destaque no estrangeiro.
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Acho que devíamos acalmar este ímpeto. Em primeiro lugar porque a probabilidade dos lusitanos no estrangeiro estarem a dar má fama ao nosso país é enorme, mesmo que sejam CEO. Por outro lado, há que ver com atenção em que tipo de organização estão a granjear sucesso. É que ainda esta semana soubemos de um "CEO" do Daesh, de origem portuguesa, que se diz arrependido. Fui logo ver a entrevista, claro. Porque tenho sempre vontade de tentar saber o que raio passa pela cabeça de qualquer rapaz pacato para se alistar no ISIS, como quem vai para a marinha, ou se inscreve no crossfit. O homem em causa chama-se Steve Duarte, uma espécie de Nelly Furtado do terrorismo: fala muito melhor francês do que português. Não por viver no Canadá mas, neste caso, no Luxemburgo. Steve poderia ter escolhido outras formas de se tornar famoso (vide Fanny, que veio da Suíça para se transformar na maior estrela da "Casa dos segredos") mas resolveu participar num vídeo de execuções do Estado Islâmico, referindo-se diretamente a Portugal: "Al Andalus, tem paciência, não eras espanhola nem portuguesa, mas sim muçulmana". Aposto que nesta altura aqueles portugueses que se entusiasmam muito com referências a este cantinho à beira-mar plantado, seja em programas da Oprah ou no Instagram da Madonna, não acharam assim tão interessante o destaque. Depois de deixar este recado ao país natal, Steve aparecia no vídeo executando a tiro uma pessoa. Uma joia de moço. O Steve, o outro não sei. Alguma deve ter feito, para ter sido capturado pelo Daesh... A verdade é que é assim, de forma cor-de-rosa, que muitos destes "Steves" parecem ver o Estado Islâmico. Partem para lá com a mesma expectativa com que eu parto para um resort na República Dominicana, se bem que neste último também começa a haver algumas chances de falecer, dadas as últimas notícias de turistas que caem para o lado. Steve diz que não encontrou propriamente aquilo de que estava à espera. Estaria à espera de quê? Mar azul-turquesa e sumo de laranja natural ao pequeno-almoço? Imagino-o a deixar uma avaliação do EI no TripAdvisor: "este Estado não é nada do que anunciam na Internet!". Neste momento é prisioneiro das forças democráticas sírias e diz-se arrependido de se ter juntado ao Daesh em 2014. Pudera. Eu quando era apanhada a roubar os chocolates do meu irmão também jurava arrependimento. Mas quando não era, até me sabiam a pouco! Steve conta que foi para a Síria para estudar ciências religiosas e para aprender árabe. Uma espécie de Erasmus hardcore, portanto. Conta que se converteu ao Islão, mas que quando chegou ao Daesh não viu "bons comportamentos nem bons valores morais", e revela que alertou os colegas de imediato de que o que eles faziam não era bom. Resta saber se este "imediato" foi antes ou depois de fuzilar o outro senhor. No fundo, Steve quis jogar uma espécie de Counter Strike de forma mais real, fora da consola. Aquilo parecia de tal forma um jogo que ele até tinha um nome falso: Abu Muhadjir Al Andalousi. Só que agora que apareceu o "game over", Steve (ou Abu) quer ver se tem mais vidas para usar. Diz que está disponível para regressar e ser preso na sua terra, o Luxemburgo. Neste caso, ninguém vai apelidá-lo de traidor, por não honrar as suas raízes portuguesas, até porque as nossas cadeias já estão a transbordar. E com a quantidade de telemóveis com ligações ao Facebook que abundam por lá, rapidamente Steve se enfiava noutra organização criminosa qualquer, para mais tarde negar tudo. Steve diz que, no Daesh, trabalhava apenas no "departamento de media e propaganda". Dito assim parece uma coisa até digna de se pôr num currículo. "Houve uma separação entre o trabalho militar e o trabalho de media. Apenas fotografava lugares lindos". Ficamos assim a saber que ser soldado do Daesh é o emprego de sonho para qualquer influencer. Fotografar lugares lindos, daqueles que nem precisam de filtro, é com elas. E com o Steve, pelos vistos. Realmente há quem arrisque tudo por uma boa fotografia, desde selfies à beira de precipícios até integrar as fileiras da jihad....
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Para Manuel Luís Goucha, que fez as pazes com Filomena Cautela, esta semana, no "5 para a meia-noite", o mesmo programa que processara há 10 anos, por causa de uma piada. Uma piada que tinha o problema de nem se perceber bem que o era, mas que não deixava de o ser. E, talvez por isso mesmo, por ser uma piada, Goucha admitiu que, se fosse hoje, não moveria qualquer processo. Que bom que é vermos a evolução diante dos nossos olhos. Agora é esperar que as piadas estejam à altura dos acontecimentos.
*HUMORISTA