Numa semana em que tanto se tem "batido" em Joacine Katar Moreira, gostaria de começar por elogiar a deputada do Livre.
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Joacine é uma política astuta: arranjou uma forma bastante original de roubar tempo de antena a André Ventura. Joacine já tinha deixado no ar alguns sinais de que isto poderia acontecer. Se calhar não lhes demos a devida atenção. No fundo é como quando começamos a chocar alguma, e achamos que aqueles arrepios e dores de cabeça são só uma impressão. Joacine está agora a chocar muitos dos que nela votaram, e também quem nunca nela pensou votar. Será isto a tal "interseccionalidade" de que tanto falou na campanha? É que, da Esquerda à Direita, todos consideram que perdeu a cabeça.
Foi a abstenção no caso da condenação das agressões de Israel à Palestina que chamou a atenção (novamente) para Joacine, depois de toda a saga de "assessor-vai-de-saia-mas-recusa-se-a-comentar-a-saia", e de Daniel Oliveira acusar Joacine de exagerar nas declarações sobre si mesma e não sobre política, sendo por sua vez acusado por ela de ser de extrema-direita, ficando assim explicado porque é que a deputada não fala mais vezes sobre política.
Desta feita, ao abster-se numa questão em que a posição do partido era clara, Joacine quis mostrar quem manda. Depois fingiu um problema de comunicação: telefones, emails, fax, nada funcionou para entrar em contacto com Rui Tavares, como se de repente o bug do milénio tivesse chegado, com 19 anos de atraso. Temo que chegue o dia em que Joacine possa mandar, de facto, em todos nós, porque acho que esse autoritarismo lhe sai com grande naturalidade. Não precisaria de se esforçar muito para ser uma excelente ditadora (aqui fica mais um elogio, para contrariar a onda de críticas!). Em poucos meses de vida pública conseguiu mostrar predicados que lhe valeriam a vitória se fizessem uma espécie de "The Voice" para encontrar o próximo grande déspota de Portugal. Reparem: considera que toda e qualquer crítica que lhe seja dirigida é discurso de ódio. Kim Jong-un não diria melhor! No início de novembro, Joacine disse que tinha começado a escrever um artigo há meses onde identificava quatro tipos de discurso de ódio. A deputada não tem mesmo tempo para nada: não só falha prazos para entregar projetos de lei como não consegue acabar um artigo em tempo útil. Um dos discursos de ódio apontado era dizer coisas como "sinto-me enganado, julguei que... mas afinal não". Ou seja, qualquer eleitor que neste momento esteja desiludido com o trabalho da deputada não poderá dizê-lo, sob pena de estar a "afirmar a sua masculinidade violenta". Outra característica de Joacine que desconhecíamos é esta difícil convivência com os jornalistas que, imagine-se, lhe batem à porta para fazer perguntas. Tirano que se preze não vê com bons olhos o trabalho dos jornalistas, sempre a meterem-se onde não devem. Haja GNR para os proteger, tipo guarda real. É curioso que a única deputada de um partido chamado Livre pareça ter tanta dificuldade em lidar com a liberdade de Imprensa. Na verdade não estou certa de que seja correto afirmar que Joacine é deputada do Livre. Acho que o Livre é que é o partido de Joacine, ainda que só o tenha descoberto agora. Foi uma espécie de carjacking: Joacine tirou Rui Tavares do volante, atirou-o borda fora e deu uma boleia ao assessor, Rafael Esteves Martins, seguindo os dois a alta velocidade. A rapidez é tanta que se torna difícil para nós, comuns mortais, acompanhar o que dizem. "A cultura de trabalho de Joacine é uma cultura de descanso, no sentido intelectual do termo", disse Rafael. Se percebi bem, a Joacine é como eu: gosta de estar de pijama a ver Netflix, com a desculpa de que está "a fazer pesquisa"... mas com jornalistas constantemente a bater à porta, não dá! Também eu ficaria enervada. A deputada disse, a propósito do caso da Palestina, que votou contra a direcção de si mesma. Mais uma frase enigmática. Sempre criticámos muito a linguagem hermética da classe política mas, ao pé disto, até as cativações são fáceis de entender! Joacine veio dizer que foi eleita sozinha (essa parte percebi) e parece-me que vai acabar o mandato sozinha também. "Orgulhosamente só"?
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Para o criador da black friday: era bom que soubéssemos sempre quando há ajuntamentos de gente com pouco discernimento e muita vontade de gastar dinheiro, para evitarmos frequentar superfícies comerciais nesse dia. Devia ser black friday todas as sextas. Assim sobravam-nos outros seis dias para fazer compras de forma civilizada, enquanto os fãs da black friday lambiam as feridas e eram operados às fraturas múltiplas.
* HUMORISTA