Posso até conceder que "João Luís Barreto Guimarães" não é um nome fácil de decorar. Não só contém a mais rara combinação de nomes, "João" e "Luís" - quando o mais usual é o díptico "José Luís" - como se socorre, quiçá, de apelidos a mais para designar um poeta. Em Medicina, onde tudo tem de viver de um muito mais objectivável sentido prático, escolhi somente "João Guimarães" para me identificar entre colegas.
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Noutro lugar já contei o que me levou a optar por este "nom de plume" para me nomear em poesia - uma explícita homenagem ao poeta João Miguel Fernandes Jorge, cuja obra me levou a escolher a poesia como género literário de eleição após uma curta incursão pela ficção (nunca publicada em livro) e pela crónica. Hoje, devo reconhecer uma certa dose de candura da minha parte em pretender que alguma vez os meus leitores (!) conseguissem dizer "João Luís Barreto Guimarães" da mesma forma "clara e limpa" como cantam Sophia de Mello Breyner Andresen sem se enganar uma só vez. Os anglo-saxónicos, pomposamente, resolveram o problema dos nomes longos recorrendo às iniciais: W.(illiam) B.(utler) Yeats; T.(homas) S.(tearns) Elliot; D.(avid) H.(erbert) Lawrence. Costumo presumir, entre amigos, que a verdadeira glória literária só chegará não com o esgotar de alguma edição de um dos meus livros de poemas (!) levando o meu editor a reeditá-lo nesse mesmo ano (!!), sequer com a aceitação de algum importante prémio literário (!!!), mas nesse instante único em que os leitores - e, fundamentalmente, a imprensa - conseguirem elencar correctamente "João Luís Barreto Guimarães" sem trocar nomes ou apelidos.
Guardo com desvelo uma carta do poeta Joaquim Manuel Magalhães dirigida a um tal de João Luís Barreto "Magalhães", quiçá seu primo afastado, certamente, porém, com metade do seu talento poético (um pouco mais de metade, vá, depois da desastrosa revisão da obra que em tempos encetou) e ainda tenho para aí o recorte de um artigo do insuspeito "Jornal de Letras" dando conta da edição de mais um livro de um tal de João Luís "Barrento" Guimarães, poeta decerto familiar do excepcional ensaísta e tradutor Professor João Barrento que tantos e tão bons autores germânicos tem vertido para a língua de Manuel António Pina. Lapsos que me favorecem, como é bom de ver.
Contudo, a troca que mais vezes me amola é tomarem por "José Luís" a mais bela e invulgar combinação de nomes que é "João Luís". Não que eu tenha alguma coisa contra os inúmeros "José Luís" que povoam a vida intelectual e anónima deste rectângulo - tenho bons amigos que respondem por esse díptico, como o José Luís Fougo ou o José Luís Reis -, mas roubarem-me a possibilidade de emparceirar com o meu homónimo, o arquitecto João Luís Carrilho da Graça, condói-me.
Há tempos, aconteceu de novo no arranque de um artigo que a jornalista Fernanda Câncio preparou para o "Diário de Notícias", onde relembrava a passagem de três portugueses - o actor Ivo Canelas, o artista plástico João Onofre e o poeta "José" Luís Barreto Guimarães - pela cidade de Nova Iorque, no mês dos atentados contra as Torres Gémeas, em 2001, altura em que me encontrava em Manhattan a realizar um estágio de cirurgia reconstrutiva da mama, experiência que deixei inscrita na crónica "O Fim do Verão em Nova Iorque" que a revista "Grande Reportagem", então dirigida por Francisco José Viegas, publicaria em Setembro do ano seguinte.
Na passada semana, voltou a suceder, na entrevista que António Lobo Antunes deu ao "Público", quando a dado passo o generoso cronista e romancista afirmava: "Temos óptimos poetas. Há poetas vivos muito bons. Mandaram-me um livro do "José" Luís Barreto Guimarães e gostei imenso daquilo. É bom."
Nada de verdadeiramente grave, suponho. O elogio compensa em muito o equívoco que alguém daquele jornal se apressou a reconhecer dias depois. Mas, começo a ficar tão habituado a estes lapsos onomásticos, que ainda não perdi a esperança de um dia vir a ser convidado para a Feira do Livro de Madrid e ser apresentado ao público espanhol como o novel poeta português "José Ruiz Barrento Magalhães".
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