Perguntei à minha filha mais velha (17 anos) o que faria se saíssemos do euro. Respondeu-me que tentaria emigrar logo que possível. E que muitos amigos fariam o mesmo. Claro, os que pudessem. Os que tivessem qualificações para isso. Mas talvez mesmo os que não tivessem qualificações o fizessem, pensei eu. E fiquei com uma dúvida: as pessoas com menos de 30 anos acham que o euro deve acabar? Isto está a ser levado em conta?
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O fim do euro pressupõe o restabelecimento de fronteiras e radicais limitações ao mercado laboral europeu. Isso não gera, de certeza, nenhum ciclo virtuoso de emprego (e económico) na Europa. Pelo contrário. Conheço e trabalho com muitos 'sub-30' que não se imaginam sem poderem viajar livremente - seja em lazer, trabalho ou estudo. São europeus e não imaginam ser outra coisa, apesar do maniqueísmo Norte-Sul que veem diariamente nas notícias. Fazem parte de uma Europa interdependente - está--lhes nos genes. E muito disto aconteceu através de coisas simples como o velhinho InterRail, o programa Erasmus, depois as low-cost, os festivais de música e o turismo, mas também a Ciência e a Cultura. E hoje a Internet e os novos amigos.
E, no entanto, a realidade europeia está marcada por quase 50% de desemprego jovem nos países do Sul da Europa. Que mundo novo afinal é este? Quem os esqueceu? Os jovens alemães querem o seu país cada vez mais rico e rodeado de pessoas como eles sem nunca terem trabalhado? De que lado fica a "livre" e "social" França numa Europa que afinal não tem "liberdade, igualdade e fraternidade"? E como se partilha esta Europa pioneira da sustentabilidade, com as mais belas cidades do Mundo, fruto de uma História e civilização ímpar, num quotidiano global trucidado pela violência social e económica?
Claro que esta conversa da Europa e do euro não enche barriga. Rui Tavares, o eurodeputado independente que faz parte dos Verdes Europeus, diz no seu novo livro que "a ironia da crise soberana é que esta denominação está fundada num duplo equívoco: onde há dívida, ela não é soberana; e onde há soberania supranacional, existe na verdade pouquíssima dívida". Porque soberania, mais do que tudo, é hoje a nossa língua, a cultura, a preservação do território. Não uma moeda. E esta é a tragédia europeia que mata a ajuda entre as nações. O euro, sem mutualização de dívida, espalha pobreza na periferia, apesar de criar riqueza no conjunto da Europa. É contra tudo o que é racional - se é que há uma Europa e não várias.
"A Ironia do Projeto Europeu" tem dezenas de frases lapidares sobre o que estamos a viver e escolho esta de Niebuhr: "A causa primária do nosso desastre será a força de uma nação gigante comandada por olhos demasiado cegos... e essa cegueira não ter sido induzida por qualquer acidente da natureza ou da história, mas antes pelo ódio ou pela vaidade". Rudolph Niebuhr foi um teólogo que viveu o essencial da sua vida nos Estados Unidos e cuja origem era, curiosamente, alemã. Escreveu as suas obras depois da dramática experiência da II Guerra Mundial e já na altura alertava para a necessidade de uma força comum europeia que contrariasse hegemonias, fossem elas de que país fosse.
Evitar o caos devia obriga-nos então a reconhecer um facto geracional: estamos a entrar numa outra fase. As novas gerações nasceram sem fronteiras mentais e não podemos aprisioná-los na arcaica desgraça nacionalista europeia. Eles serão capazes de encontrar novas ideias e novos mercados, e serão provavelmente mais europeus/globais do que nós alguma vez fomos (somos). Mas para 'existirem', precisamos de lhes dar a oportunidade de trabalhar e de terem voz política. A economia social das empresas não pode continuar a ser apenas a caridade, tem de ser formação e emprego. A política é mais do que conflitos eternos entre governos e sindicatos, sem que as novas gerações tenham representantes e façam parte do problema.
Os 'sub-30' são uma garantia para as gerações mais velhas de que haverá Estado social - porque há economia. Se lhes dermos a oportunidade de aplicarem a educação que tanto nos custou a pagar-lhes, talvez eles salvem o nosso velho mundo retribuindo com 'crescimento' e outro modo de vida. Não vejo outro caminho.