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A violação do segredo de justiça é tema recorrente na Comunicação Social, aquando e na sequência de grandes operações judiciárias, no âmbito dos crimes de colarinho branco. Comentadores e analistas debruçam-se sobre a questão, condenando vigorosa e assertivamente a corrente de informação sobre a investigação, que deveria ser confidencial, mas, vertida das mais diversas formas nas notícias apresentadas em termos de escândalo social e/ou político. O que a maioria dos cidadãos ignora e poucos críticos sabem é que o paradigma tradicional de um inquérito obrigatoriamente sujeito ao segredo de justiça já não existe, numa alteração da lei que parece satisfazer interesses criminosos, altamente maliciosos para a justiça.
O CPP, há cerca de 15 anos, coincidentemente com a intensificação da investigação do crime económico-financeiro pelo MP, consagrou a publicidade do processo penal, em qualquer das suas fases, investigação, instrução e julgamento. O processo penal é, sob pena de nulidade, público, salvo as excepções previstas na lei. Estas excepções são passos de dança rocambolescos a que é sujeito o inquérito. Sublinhe-se que é o MP que dirige a fase da investigação. No interesse superior da busca da verdade material e na defesa dos direitos e do bom nome do arguido, o MP entende ser imprescindível o prosseguimento da investigação em segredo de justiça. Assim o decide, mas não é definitivo. Tem de remeter o processo ao JIC, que não conhece o seu conteúdo, e que pode não ser sensível às razões invocadas pelo titular do inquérito, mas é ele que decide definitivamente. Mas, na hipótese de ter sido decidida a aplicação ao processo do segredo de justiça, o arguido, o assistente ou o ofendido podem requerer o seu levantamento ao MP e, se este não decidir em conformidade, os autos são remetidos ao juiz de instrução, que decide por despacho irrecorrível. O titular do inquérito tem a sua direcção condicionada e coarctada pela eventual intervenção contínua dos outros sujeitos processuais na tramitação do processo. A publicidade implica, além do mais, a narração dos actos processuais, ou a sua reprodução, pelos meios de Comunicação Social. A estes órgãos é permitida a narração circunstanciada do teor de actos processuais, assim como lhes é autorizada a publicação de conversações ou comunicações interceptadas no âmbito da investigação. Ainda, no caso de publicidade do inquérito, o arguido, o assistente, o ofendido ou lesado podem obter cópia das gravações áudio ou audiovisuais de todas as declarações prestadas. Se o MP não autorizar é o JIC que decide por despacho irrecorrível. Segredo de justiça, onde e para quê?
*A autora escreve segundo a antiga ortografia