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Como Balsemão, era filho único. E como ele, um sedutor que prestava culto ao futuro. Mas deixem-me escrever um pouco sobre Laborinho Lúcio, sobre o que mais ninguém tinha, sobre o que nele era original, único e intransmissível. Em primeiro lugar, a energia. Era uma bomba de luz, chegava aos sítios e não se conseguia olhar para mais ninguém, queríamos ouvi-lo, aproveitar o momento, aprender - conheci algumas pessoas que por ele se apaixonaram, o que não admirava. Em segundo lugar, o modo magnético como comunicava. Nunca conheci ninguém com tanta capacidade de juntar palavras, de as misturar e de as obrigar a renascer mais bonitas, mais justas, mais prontas para serem vividas pelos outros. Em terceiro lugar, a humildade. Não por não ter ego - já vos disse que era filho único? -, mas por gostar de partilhar e de ouvir os outros, os mais novos, os falhados, os vencidos, os populares que o abordavam na rua. Recebia todos, encarava-os com aqueles olhos de ator francês de Nouvelle Vague, com aquele nariz de general bonapartista, com aquela distância imensamente próxima. Em quarto lugar, pelo que nos deixou. Como juiz, procurador e ministro, mas também como escritor e ator. Viu-o nas Correntes d"Escritas a fazer o papel do mítico Manuel Lopes, bibliotecário anão e corcunda da Póvoa de Varzim? Há momentos em que a porta da morte se abre e vários dos que admiramos aproveitam para nos virar as costas, espero que fique por aqui. Laborinho Lúcio foi um dos melhores portugueses. Um homem verdadeiramente apaixonante.

