<p>Lembro José Saramago pelos seus livros, pela militância cívica da sua vida e pelos, (infelizmente poucos), contactos pessoais que com ele tive a honra de manter. Recordo como, há muitos anos, devorei "em duas directas" o Memorial do Convento, depois de várias tentativas sem passar das primeiras páginas. Recordo como, depois, se tornou fácil reler Levantados no Chão ou entrar em todas as conversas que os seus livros são.</p>
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Lembro também, há cerca de ano e meio, uma louvável iniciativa de Fernando Rocha (esquecida da Comunicação Social…), no salão da Câmara de Matosinhos, pondo Siza Vieira e José Saramago a trocarem olhares e pontos de vista … sobre a obra do outro. Antológico!
Lembro o momento em que o conheci, no final dos anos noventa, quando, aceitando um convite dos três eurodeputados do PCP, fez o Parlamento Europeu parar e superlotar o maior auditório de Bruxelas.
Lembro as palavras lúcidas e frontais com que, da mesma maneira, comentava as suas obras e os momentos políticos nacionais em que participava ao lado do Partido "que quis que fosse o seu até à morte".
Na despedida física não surpreendeu a emoção do povo. Somos assim. O que mais impressionou foi o ponto extremo de desprezo e ódio que continuam a votar-lhe algumas instituições e personalidades. O comentário ontem feito no jornal do Vaticano - acusando Saramago de extremismo e populismo - ilustra bem a razão pela qual a Igreja, como instituição, anda tão afastada do pulsar da Vida e do Sentir dos homens e mulheres do século XXI. O mesmo se pode dizer da ausência de Cavaco Silva das cerimónias fúnebres, (apesar de ter dito que cumprira as suas obrigações protocolares), ilustrando bem a pequenez da personalidade que hoje ocupa a Presidência da República.