Uma das notícias dos últimos dias no Brasil, foi a decisão unânime do Tribunal Superior Eleitoral de conceder 116 direitos de antena à campanha de Lula que, por sua vez, são retirados ao horário que pertencia a Bolsonaro. Trata-se de quase um dia inteiro de televisão que foi atribuído como direito de resposta, devido a afirmações consideradas irregulares, que afirmavam o envolvimento de Lula com o crime, assim como diversas afirmações imprecisas ou comprovadamente falsas.
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Estes argumentos do tribunal nunca foram referidos na manifestação junto ao MASP, Museu de Arte de São Paulo, onde estive no início da noite de ontem. Lá, o nome do tribunal era sempre recebido com vaias e todos os contornos deste tema foram resumidos a um caso de censura. A convocatória, aliás, chamava para um "ato pela liberdade de expressão" que, ali, significava gritar em coro: "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão", ou "Ei, Xandão, vai tomar no cu" ("Xandão" referia-se a Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil). Os discursos ao microfone, do cimo de um carro com colunas, acusavam Lula exatamente das mesmas coisas de que normalmente Bolsonaro é acusado: de ser mentiroso, de querer destruir a democracia.
Tentando registar o ambiente, eu captava imagens com o telemóvel e, talvez porque não repetia as palavras de ordem, talvez porque recusei por duas vezes cartazes que me quiseram entregar, senti, a partir de certa altura, que um homem andava sempre atrás de mim. Para onde ia, ele ia também. Durante alguns minutos, ficámos a alguma distância da multidão e, então, ficou claro que não me ia largar. Enquanto pensava no que fazer, vi um rapaz que estava por perto a vender brigadeiros. Comecei a falar com ele, contou-me que era do estado do Espírito Santo, capixaba, e que vendia doces para pagar a faculdade, comprei-lhe dois brigadeiros. Talvez porque o meu perseguidor achasse que agentes infiltrados não comem brigadeiros, desinteressou-se de mim por instantes. Foi então que aproveitei para me afastar o mais longe possível dali.
*Escritor