Leio pouca ficção, para ficção basta-me a realidade. Mas hoje, ao saber que Passos Coelho mostrou "abertura" para a constitucionalização de limites ao défice, deu-me para folhear a Constituição da República Portuguesa, 7.ª edição, revista e diminuída.
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É uma obra imaginosa. Começa assim: "A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista". Não é, porém, um romance histórico mas, sim, um exemplo atípico de realismo fantástico como mostram, em dias de "troika" e da garantia (do mesmo Passos Coelho) de que não serão taxadas as grandes fortunas, expressões como "independência nacional" e "sociedade justa e solidária".
O mesmo se diga dos capítulos que falam de como o Estado (o principal protagonista) se obriga a promover a "igualdade real entre os portugueses", de "procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade", de "a informática não [poder] ser utilizada para tratamento de dados referentes à (...) vida privada", de "segurança no emprego", de "[correcção] das desigualdades na distribuição da riqueza (...) através da política fiscal" ou, no que respeita a objectivos dos impostos, de "diminuição das desigualdades" e de "justiça social".
Tudo lido, compreendi Passos Coelho: não haverá mal nenhum em pôr na Constituição limites ao défice. Será também , como o resto, ficção.