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É em nome da renovação do Bloco de Esquerda que Francisco Louçã abdica de ser líder, falta saber qual: a das ideias? A das personalidades? Ou ambas? O mais provável é que a realidade seja a combinação das três renovações, o que não será fácil porque o Bloco é mais uma frente de ideologias diversas que um partido tradicional.
Deixemos de parte, por ora, a frase com que Louçã desfez o tabu da liderança mas criou outro, o da sua vida política futura, que ele próprio definiu de participação em todas as lutas que "a imaginação venha a ditar".
Mas se o futuro real de Louçã terá de esperar sob pena de estarmos a praticar futurologia de pacotilha, outra coisa é procurar entender as razões que poderão ter feito com que este antifascista, primeiro, e posteriormente trotskista, com 39 anos de militância política, tenha concluído que já não era ele a solução mais imaginativa para continuar a liderar o Bloco, seja nas lutas sociais e políticas, ou nas eleitorais, a principiar pelas autárquicas.
Talvez não seja um despropósito considerar que Louçã terá de facto gasto imensa da sua imaginação a colar a economia à política, o que, tendo sido sempre um enorme problema para os sucessores de Marx, acabou por se transformar numa charada da globalização. Ora, Louçã é um académico e um economista reputadíssimo, pelo que, nestes 13 anos que leva de liderança, deve ter sido obrigado a um esforço colossal para que alguns dos radicalismos, sobretudo de linguagem, não apoucassem a sua dimensão académica.
Talvez não seja também despropósito considerar que após ter feito o socratismo em cacos e não ter conseguido as boas graças do PCP para as suas frentes políticas - os comunistas apressaram-se já a fazer saber que não vão ter saudades da sua partida -, Louçã possa ter considerado inviável para si mesmo imaginar algo que não repetisse a sua tentativa - que chegou a ser eleitoralmente empolgante mas caiu abruptamente - de fazer do Bloco outra coisa que a força de causas mais ou menos fraturantes tal qual nasceu.
Talvez não seja também despropositado considerar que do empolgamento à depressão eleitoral, Louçã tenha interiorizado que só um novo nível de imaginação política poderia ser compatível com a sua própria atitude científica no domínio da sua carreira de economista. E que essa conclusão - ou seja: que o frentismo nacional é certamente curto perante os desafios da globalização capitalista - o tenha decidido a trabalhar ideias mais no quadro do internacionalismo socialista, próprio, aliás, do trotskismo, que no plano da política portuguesa. E ainda que as coisas não possam ser separáveis, talvez não seja despropositado pensar em Louçã à procura de uma nova intervenção política: europeia. E por que não com o seu amigo grego, Alex Tsipras?