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Já foram votar? Bom, caso se estejam a preparar para ir, deixo algumas recomendações para o que vai acontecer naquela cabina de voto. É que, nas autárquicas, são três papelinhos, logo é importante evitar lesões. São tantas dobras e cruzinhas que correm o risco de ficar com uma tendinite. Então, antes de pegarem na caneta, comecem a aquecer os pulsos: virar para a esquerda, virar para a direita. Mas não se ponham a virar demasiado para a direita porque podem guinar de uma maneira que nunca mais votam na vida. Tenham cuidado com isso. Se por acaso já votaram, façam gelo nas articulações de meia em meia hora até às oito da noite, visto que esses dedinhos vão ser precisos para fazer figas quando saírem as primeiras projeções.
O dia de reflexão, tão desvalorizado por muitos, é fundamental para este tipo de eleições. Não sei como é que vocês o aproveitaram, eu cá passei-o a ler sobre as listas à Assembleia de Freguesia, as listas à Assembleia Municipal e as listas à Câmara Municipal. Como são tantos nomes, quis exercer o meu direito da forma mais informada, portanto, obviamente que passei o dia a tentar ver que pessoas é que conheço. Não vou votar nesta candidatura, pois está lá a Mafalda e ela na primária fez queixa de mim à dona Alice da cantina porque eu escondi a minha fatia de rolo de carne no estojo. Era de tal forma intragável que, durante décadas, estragou o conceito de carne picada, para mim. Portanto, chupa, Mafalda. Olha o César! Aqui na praceta, o César tinha o cognome de O Calão. Não vou votar numa lista que acha que o César está apto para opinar sobre higiene urbana e a decidir sobre buracos na estrada quando ele nem os títulos dos trabalhos de grupo fazia. Nem pensar. Eish! A Filipa que não se calava sobre ser escuteira. Uma vez pediu-me um top emprestado para ir ao Garage e nunca o devolveu. Vou votar nela porque é da maneira que na próxima Assembleia de Freguesia me posso inscrever para lhe perguntar sobre este desvio de recursos que se mantém há décadas sem que ninguém fale disso.
Já fazer a minha escolha para a Câmara Municipal de Lisboa foi mais difícil. As campanhas foram muito interessantes, começando logo pelos slogans das candidaturas que nos permitem perceber como é que veem a capital do país. A campanha da coligação PS/LIVRE/PAN/BE teve como mote "Viver Lisboa". Teve a honestidade de excluir a preposição "em" porque com o valor do metro quadrado na cidade seria uma promessa impossível de cumprir. Assim, "Viver Lisboa" é verdadeiro. A malta vem cá, bebe umas bicas, come uns pastéis de nata, aluga uma Gira, arrisca a vida numa ciclovia e no final regressa à Lourinhã que é dos sítios mais perto da capital em que ainda se consegue arrendar casa. Depois temos a coligação PSD/CDS/IL cuja assinatura é "Por ti, Lisboa". A tratar Lisboa por tu de maneira a passar a imagem que somos todos superjovens, como aquele tio que quando nos encontra no jantar de família e nos pergunta "onde é que hoje se sai para abanar o capacete?". Lisboa merece respeito, Lisboa é uma cidade antiga, Lisboa está a um tapete do banho mal posto de partir uma anca e não se levantar mais. Espetar-lhe um bubble tea na mão e uns ténis da moda não resolve quando o que Lisboa precisa é de uns sapatos ortopédicos para se sentir mais confortável. Já o partido Nova Democracia avançou com um "Resgatar Lisboa". Porque aparentemente Lisboa está capturada numa cave húmida. Só tenho dúvidas que a candidata Ossanda Líber seja a pessoa mais capacitada para gerir uma negociação de reféns, visto que nem o seu tempo conseguiu gerir no debate na RTP e falou permanentemente por cima dos outros intervenientes. Temo que este resgate não vá acabar bem para Lisboa. No debate da RTP, também tivemos oportunidade de conhecer a candidatura de Adelaide Ferreira pelo ADN cuja mensagem central foi "A voz de Lisboa". E eu não quero acreditar que o máximo que a voz de Lisboa consegue é um 18.° lugar na Eurovisão em 1985. A CDU avançou com um "Lisboa, cidade da nossa vida" e a do João Ferreira não há grandes dúvidas que é, visto que foi eleito vereador pela primeira vez em 2013. E Lisboa está desleixada, tem um cheiro esquisito e mesmo assim João Ferreira continua comprometido com ela. Por sua vez, o Chega apostou num slogan mais bélico "Defender Lisboa". Mais uma vez se prova que o partido de extrema-direita é um partido muito saudosista do antigamente, porque seria uma campanha muito apropriada para o ano de 1373. Pena que o candidato Bruno Mascarenhas, do Chega, não tenha conseguido chegar à fala com o Dom Fernando para encabeçar essa campanha contra os espanhóis que nos queriam invadir. É que se nos quer defender de nuestros hermanos, não era candidatar-se à CML, mas sim à polícia municipal para acabar com o barulho que fazem nos airbnbs depois das onze da noite. A campanha deveria ter sido "Reconquistar Lisboa" porque, segundo o partido de extrema-direita, é em 1147 que estamos porque temos os mouros a tomar conta disto. É que, assumir o compromisso de "Defender Lisboa" quando Bruno Mascarenhas fez parte da direção do Sporting na altura do Bruno de Carvalho, não augura o melhor.