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António Costa já formou três governos. O primeiro, de cernelha, numas salas esconsas do Parlamento onde assinou umas quantas papeletas bilaterais com a Esquerda. O segundo, minoritário, também, mas resultante directamente do voto popular. E, finalmente, este, de maioria absoluta, com um horizonte de quatro anos e meio. Ou seja, para lá do mandato presidencial de Marcelo que termina em Março de 2026. Isto se tudo correr bem para eles todos, algo que me é totalmente indiferente, salvo nas condicionantes externas de mau augúrio. Não votei em nenhum deles desta vez. Quanto ao ponto, o destino circunstancial da pátria, esse já me interessa sobretudo mais a título trágico-cómico do que por causa do "futuro" da mesma, algo para que me estou nas tintas. Ora Costa, que tinha aqui um belo momento na sua carreira artística, iniciada aos treze ou catorze anos no PS, perdeu-a. E perdeu-a ao formar um dos governos politicamente mais medíocres de que existe memória. Como a presença individual dos seus membros na Assembleia da República, para discutir o Orçamento do Estado para meio 2022, tem amplamente comprovado. Manteve gente que devia ter sido corrida sem dó nem piedade, uns no mesmo sítio, outros apenas mudando de casa. Ou acrescentando "novidades" que nada acrescentam ao país. O que significa que, mais uma vez, o Governo é só ele, Costa, para o melhor e para o pior. Marcelo, que percebe sempre tudo daqui a Marte, intuiu isto e mais. Percebeu que os bons tempos acabaram. Os dele, evidentemente, fora as cortesias a que o protocolo das visitas de Estado obriga. É rei sem coroa, e está permanentemente a ver passar os diversos espectros de Costa nos espelhos da Ajuda e de Belém. Vai daí, ao receber os partidos a pretexto do Orçamento, "queixou-se" da sua nova vida. Queria "aparecer" mais, está "alarmado" com o PM - que ele "fabricou" nesta versão "Costa, O Moderado" durante seis aturados anos -, teme revisões constitucionais, fala em sucessores sem se rir (conseguindo pôr o país a rir com as duas sugestões televisivas em apreço). Por fim, defendeu que devemos "beneficiar" da guerra na Ucrânia porquanto "o inteligente é saber aproveitar essa ocasião" de estarmos longe dela, logo, somos "um beneficiário líquido" (palavra de honra) do que se passa na Ucrânia. Transformou-se num Macbeth sem Lady. Conhecem a tragédia de Shakespeare, com certeza. Num aparte, Macbeth, muito lúcido e muito cedo, previu tudo. "Meu pensamento move de tal sorte que as faculdades se me paralisam. E nada existe mais senão aquilo que não existe". Leia, ou releia, a peça, senhor presidente. Vai ver o bem que lhe faz.
o autor escreve segundo a antiga ortografia
Jurista