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Hoje é uma certeza que os países mais desenvolvidos são, frequentemente, os mais descentralizados e com maior proximidade e ajustamento do nível de decisão à realidade dos territórios, potenciando modelos económicos articulados com as vantagens comparativas de cada região.
O relatório sobre o estado da coesão na UE (março, 2024) confirma que a política de coesão desempenhou um papel essencial na melhoria global dos indicadores económicos, sociais e de emprego, contudo, regista perda de competitividade de algumas regiões ricas e persiste o atraso das regiões desfavorecidas. Os desafios tendem a ser mais agudos nas regiões rurais e pouco povoadas, caso do Interior português.
É neste contexto que na Europa se debate o ciclo de programação futuro, após 2027, ecoando vozes que defendem um modelo de gestão mais centralista dos fundos europeus, a exemplo do modelo do PRR que, contudo, teve a sua especificidade circunstancial. Um tal eco preocupa-nos porque indicia um modo redutoramente tecnocrático de ver as coisas. Com base no histórico, parece evidente que a política centralizada dos fundos num país com um modelo de organização centralista como o português pode traduzir-se num retrocesso e num desajustamento das decisões à realidade do território.
Vencer o atraso europeu
O fosso de competitividade entre a UE e as principais superpotências mundiais é referido no relatório Draghi de setembro de 2024, recomendando mais investimento em ciência e inovação para responder aos desafios da transformação digital e ecológica, da segurança e defesa, da demografia e envelhecimento. Reforça a visão do relatório Letta de abril de 2024 sobre o mercado único europeu e está em sintonia com as orientações políticas Europe’s Choice, 2024-2029, de Ursula von der Leyen.
O relatório Heitor de outubro de 2024 confirma a necessidade de reforçar o financiamento para investigação e inovação, de reformas na governação e a sua articulação com os estados membros e as regiões europeias, face à necessidade de estimular a reestruturação da economia europeia e a criação de maior valor acrescentado a nível europeu.
A Europa tem um longo caminho para reduzir o atraso de competitividade face às principais superpotências. Todavia, se pretende ter um apoio amplo da sociedade, a UE não pode deixar de manter viva a ambição pela coesão entre as suas regiões.
E Portugal, já perdeu a ambição da coesão territorial?
O Governo português anunciou importantes investimentos estruturais e consumidores de recursos públicos, para a próxima década: o aeroporto e ligações ferroviárias, a terceira ponte sobre o Tejo, e a criação de uma metrópole vibrante nas duas margens do Tejo. Face ao desequilíbrio espacial de investimento público em desfavor de outras regiões do país, certamente que as respetivas CCDR não irão ficar paradas. Há dias, o Conselho Regional do Centro veio já sugerir um plano de compensação.
As nossas regiões enfrentam desafios que, caso predominem o centralismo e o imobilismo, não serão devidamente resolvidos. As regiões portuguesas serão absorvidas por novas realidades indutoras de despovoamento, surgindo deseconomias de aglomeração e impactos ambientais de difícil solução. Seguramente, o país precisa de políticas que prossigam objetivos de competitividade, sustentabilidade e equidade regional, envolvendo soluções de concertação para contrariar as assimetrias territoriais.
As reformas da organização do Estado português, da descentralização e desconcentração de serviços públicos, não podem ser adiadas. Sem tais mudanças de fundo do centralismo que nos administra, adensar-se-á o sentimento de abandono das populações fora dos principais centros urbanos, esquecidas e excluídas das decisões políticas.