Mais passeios? Talvez melhores passeios...
Na sequência do processo de consulta pública feita no âmbito da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Pedonal, a Associação Zero veio exigir que haja mais espaço para peões nas ruas. Antes de discutir dimensões quantitativas, talvez fosse avisado tomar medidas para recuperar os passeios existentes. Ninguém ganha o gosto por caminhar em pisos irregulares e cheios de buracos.
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Sempre me intrigou (muito) por que os autarcas desprezam (tanto) os passeios, sobretudo em perímetros urbanos. A uma rua não basta ter imóveis bem desenhados e incorporar aqui e ali espaços verdes, se não se cuidar prioritariamente do chão. Não é isso que acontece em tantos dos nossos espaços comuns: os buracos que se abrem permanecem por tempo indeterminado, as irregularidades provocadas por raízes de árvores vetustas quase nunca são corrigidas e a degradação acumulada pela passagem do tempo tarda em ser reparada. Se um de nós experimentar sair dos trilhos pedonais criados exclusivamente para caminhadas e se aventurar a andar a pé pelas cidades, a atenção ao chão deve ser permanente para se evitar uma entorse.
É lamentável o desapreço generalizado pelos passeios, porque seria fácil encontrar aí marcas distintivas para as nossas cidades e vilas. Não é necessário fazer grandes investimentos em calçadas típicas portuguesas. Há outros materiais que poderiam criar, por si, interessantes rotas. Nessa linha, uma rua poderia ser conhecida não apenas pelos monumentos ou edifícios que integra, mas também pelo tipo de chão que apresenta a quem por lá passa (a pé).
Não podemos incentivar mobilidades mais sustentáveis, sem acautelar outras variáveis. Em primeiro lugar, temos de criar alternativas ao transporte automóvel individual. Ora, isso revela-se difícil em Portugal, um dos países europeus que menos utilizam os transportes públicos, como este jornal já noticiou. Precisamos de intensificar outras políticas a esse nível que deem uma maior resposta de proximidade. Temos também de criar condições para as pessoas andarem a pé. A segurança e a qualidade dos lugares públicos por onde passamos são fulcrais. Quanto à primeira, o nosso país oferece altos padrões de confiança. No entanto, descuidamos muito os espaços coletivos.
Sem ter grande centralidade nas políticas urbanas, a recuperação dos passeios poderia entrar na agenda do poder político local. À partida, pode parecer um tema menor. Não é, se, a partir dele, erguermos uma estratégia de reconstrução das áreas comuns das nossas cidades e solidificarmos aí marcas ímpares.
Prof. associada com agregação da UMinho