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1.Na passada sexta-feira a maioria parlamentar, fazendo valer os seus votos, aprovou na Assembleia da República o Estatuto das Entidades Intermunicipais. A este assunto me referi aqui em novembro passado, a propósito de um conjunto de iniciativas doGoverno visando o setor autárquico, e em que demonstrava preocupação por se estarem a promover sérias alterações na organização das autarquias sem um debate profundo e sem se promoverem os consensos políticos necessários à estabilidade das modificações propostas.
O que se temia aconteceu. Toda a oposição votou contra a proposta de lei e a própria Associação Nacional dos Municípios Portugueses ( em cujos órgãos participam autarcas eleitos por todas as forças políticas com assento parlamentar ) rebateu ponto por ponto a proposta do Governo, propondo uma estrutura para estas entidades intermunicipais completamente diversa da agora aprovada. A consequência mais provável que decorre desta situação é a de que a nova legislação não sobreviva para além do tempo de vida deste Governo. Leis que mexem na estrutura do poder autárquico são suficientemente sensíveis para não deverem ser tratadas com ligeireza e para não aparecerem como sendo instáveis e inseguras.
Aparentemente, nada justificava esta pressa. As áreas metropolitanas e as comunidades intermunicipais existentes funcionam e nunca ouvimos ninguém queixar-se do seu bloqueamento. Necessitam de aperfeiçoamento? Com certeza. A experiência recolhida nos longos anos que vão decorridos desde a sua implementação sugere alguns ajustamentos. Mas nada que implique a rutura que a aprovação da lei provocou. A menos que outros interesses se acobertem debaixo desta iniciativa!
A mais polémica das inovações agora introduzidas tem a ver com a criação de cerca de 70 novos cargos políticos, os secretários executivos, que serão os verdadeiros gestores das áreas metropolitanas e das comunidades intermunicipais, ao invés do que hoje acontece com a liderança dos presidentes de câmara. Aquilo sobre que se tem especulado, é que estes lugares políticos seriam feitos à medida dos presidentes de câmara em exercício que, por terem atingido o limite de mandatos, não se irão recandidatar.
Mau seria que assim fosse, mesmo que este objetivo tenha pesado apenas marginalmente na arquitetura do modelo aprovado.
Uma outra razão releva na inoportunidade desta mudança. Comunidades intermunicipais e áreas metropolitanas como plataformas de concertação entre municípios com interesses comuns, sim. Mas conceber estas entidades como verdadeiras autarquias locais, isso não. Elas serão sempre redundantes, se tivermos regiões administrativas. Pretender que as duas situações convivam é uma hipocrisia. Só quem quer matar a regionalização e não o assume pode defender o modelo agora aprovado.
2. E a sétima avaliação da troika chegou ao fim. Todas as previsões do Governo falharam. Aquilo que era evidente vir a acontecer, só depois de consumado foi percebido por Passos Coelho e Vítor Gaspar. Falhou o défice público, depois de todo o foguetório lançado antes do tempo; e falharam todas as previsões para 2013, para mal de todos nós. O decréscimo do produto interno bruto, do consumo privado, do consumo público, do investimento, das importações, da procura interna, será mais grave do que a mais pessimista das previsões. O aumento do desemprego e da dívida pública atingirá números antes impensáveis. O crescimento das exportações treme. Tudo teve que ser revisto em piores condições do que as anteriormente assumidas. E não passaram ainda três meses de 2013. Para onde vamos afinal? O que mais falta para que Governo e troika corrijam a receita, abandonando o experimentalismo que nos tem como cobaias?
A culpa agora é da Europa "que ainda não foi capaz de encontrar o equilíbrio adequado entre resolução dos problemas do défice público e o crescimento económico e a criação de emprego ", diz o presidente da República. Da Europa ou nossa, que não soubemos negociar condições de partida possíveis de atingir e demos sempre a ideia de que as metas e objetivos definidos eram alcançáveis?
Quem se lembra de ter ouvido algum membro do Governo ou o presidente referir que, apesar das duríssimas medidas impostas aos portugueses, as consequências seriam estas? Não chegou a ser 2013 o ano da nossa recuperação?
Cada um de nós deseja, desesperadamente, receber uma boa notícia. Mas quando, depois de tudo isto, se ouve o elogio da troika, a sensação que nos fica é a de termos recebido um eloquente elogio fúnebre.