A meio da semana e se fosse escrita para vender, a expressão ganharia contornos de "best-seller" enquanto delata desejos. Tantas vezes, para nada se fazer.
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"Nunca mais é sábado", diz-se habitualmente por aqueles que não aguentam esperar pelo fim de semana ou antecipam a jornada de 4 dias de trabalho como uma inevitabilidade que o futuro trará. Ou por aqueles que tanto esperaram para uma mudança de líder no PSD. Amanhã, depois da febre de sexta-feira à noite de hoje onde se tentarão contar os derradeiros grãos de apoio, o PSD irá a votos para uma eleição directa que escolhe entre dois candidatos que mostraram tão pouco de si durante a campanha que a imagem que deles retemos é a de um passado que antecipa um longo rio tranquilo para os próximos anos do governo de António Costa.
A previsível vitória de Luís Montenegro fará com que o partido ajuste contas com a sua mais notável sombra, o candidato a líder que nunca foi. Os anos que Montenegro passou à espera, os anos que Montenegro passou nos bastidores, as eleições onde não foi e poderia, as eleições onde não deveria ter ido mas foi, entre vitórias que nunca foram apenas suas e derrotas sempre ou quase pessoais, farão deste momento um acto insólito e algo inóspito de glória. Os militantes deverão eleger Luís Montenegro num contexto de liderança no deserto, sem perspectiva de poder, coincidente com quatro anos de maioria absoluta do PS e uma bancada parlamentar herdada de Rui Rio, cenários de retoma económica pós-covid e execução distributiva do PRR. Um fardo pesado e desanimador para as hostes laranja e que, certamente, hipoteca grandes exaltações triunfantes. Mas ninguém duvida do regresso do PSD à política, quando encontramos o providencial homem certo no seu momento. Montenegro é aquele que nunca se cansou de esperar.
Se o apelo estratégico de Francisco Balsemão não surtiu efeito, em que se baseiam as bases do PSD? Numa campanha eleitoral onde não se ouviu uma única troca de ideias, não se viu um único debate, não se acrescentou uma qualquer ideia ao país, os dois candidatos anularam o seu presente sem apresentarem uma centelha de futuro. Tudo o que deles sobra é passado. Nem o apoio do fundador do partido a Jorge Moreira da Silva bateu na consciência e repercutiu na militância. Um enorme vazio, este, o que coroa a fulanização da política. Um grande deserto que deverá entregar pontos de bandeja à direita do PSD, com a qual - de resto - Montenegro já admitiu entendimentos sem exclusões ou cordões sanitários. A autofagia. O país continuará órfão de ideias do PSD, enquanto este aluga o seu espaço político a quem se alimenta com a demagogia, a troco de promessas de um poder irrealista.
Músico e jurista