Um dos advogados que defende Isaltino de Morais terá ficado surpreendido pelo facto de o Tribunal Constitucional ter demorado apenas oito dias para decidir um recurso interposto pela defesa.
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Esse recurso indignou o presidente do Sindicato dos Juízes, a ministra da Justiça e os sicofantas que pululam nos jornais sempre prontos a denunciar os violadores da moralidade dominante. Para todos eles o recurso não passaria de uma "manobra dilatória" com a finalidade de atrasar o processo e o início do cumprimento da pena a que o arguido fora condenado. A surpresa do advogado de Isaltino confirmaria que o recurso só teria sido interposto com a esperança de que o tribunal demorasse muito tempo a decidi-lo e, entretanto, o processo prescrevesse.
Confesso que também fiquei muito surpreendido com a rapidez do TC. Agradavelmente surpreendido, porquanto, não só se anulou de imediato uma pretensa "manobra dilatória", mas sobretudo porque se demonstrou que é fácil fazê-lo. Mostrou-se que os tribunais podem decidir recursos em prazos curtos e que, fazendo-o, tornam ineficazes os expedientes que apenas visem prolongar o processo. Afinal não é preciso alterar leis para resolver este problema.
Na verdade uma "manobra" só se torna "dilatória" com a cumplicidade dos magistrados, sobretudo dos juízes, que não a decidem atempadamente. Que um advogado utilize todos os mecanismos previstos na lei (e só estes é que estão em causa) para defender os direitos e interesses do seu constituinte é a coisa mais normal do Mundo. Sempre foi assim em todas as épocas e locais. Agora que os magistrados demorem anos a decidir um recurso ou meses a decidir uma reclamação ou um pedido de aclaração, isso é que já não é normal. É precisamente essa lentidão dos magistrados que incentiva o recurso às tais manobras dilatórias. Se todos os juízes decidissem com a rapidez com que o TC agora decidiu, ninguém mais interporia recursos com fins meramente dilatórios porque a rapidez da decisão evitaria o efeito pretendido.
O processo judicial é um processo de partes em que a parte que pede justiça quer que o processo ande depressa e a parte que presta contas à justiça quer que ele ande devagar. Nada mais natural. O bom juiz equilibra essas duas pretensões não permitindo que o processo ande demasiado rápido para não atropelar os direitos e garantias da parte demandada, mas também não tolerando que esta paralise ou atrase demasiado o processo com actos que, no limite, possam inviabilizar os próprios efeitos da sentença. Quando alguém usar algum procedimento para atrasar o andamento do processo deve o juiz decidir rapidamente a questão levantada para evitar, justamente, o que se pretendeu: lentidão processual. A rapidez das decisões judiciais é a melhor resposta para quem recorre a manobras dilatórias.
Por outro lado, o exercício abusivo de um direito deve levar à punição do abusador e não à eliminação ou mesmo à restrição do direito. Se eu (ab)uso (d)o direito de recurso para fins diferentes daqueles para que foi criado, então eu devo ser punido por isso, através, por exemplo, de condenação em taxas de justiça mais elevadas. O que não se deve fazer é restringir ou eliminar um direito de todos só porque alguns abusam dele.
Infelizmente há cada vez mais oportunismo à volta desta questão. Desde o Sindicato dos Juízes, cujo único objectivo é restringir ou eliminar os direitos processuais das partes e, assim, diminuir o trabalho dos seus associados, até à própria ministra da Justiça que, a propósito deste caso, logo veio proclamar que ia alterar as leis para acabar com as manobras dilatórias, passando, obviamente, pelos sicofantas que, por ignorância, servilismo em relação às magistraturas ou simples cretinice, se transformaram em megafones de todos aqueles que não convivem com uma advocacia independente, combativa e defensora intransigente dos direitos e interesses legítimos dos cidadãos. Todos ignoram ou fingem ignorar que os melhores aliados das manobras dilatórias são os magistrados preguiçosos e que os seus maiores inimigos são, precisamente, os magistrados diligentes que não deixam atrasar as suas decisões.