<p>Já vai em cerca de 60 o número de personalidades convocadas pela Comissão de Ética para deporem sobre o magno problema do "exercício da liberdade de expressão". Ao ritmo de umas seis por semana, está visto que lá para Agosto os deputados da Comissão de Ética ainda terão de alugar uma sala num restaurante junto à praia para ouvir tanta gente, no intervalo entre duas banhocas.</p>
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O povo há-de rejubilar com tamanha dedicação à causa. Mas é muito pouco provável que da "maratona" de audições possa extrair-se algo de útil para a saúde da liberdade de expressão ou capaz de esclarecer as suspeitas que por aí andam sobre planos do Governo para condicionar a Comunicação Social.
O facto de os parlamentares não terem optado pela criação de uma comissão de inquérito sinalizou, desde logo, um caminho. Um caminho para o vazio em que se torna a longa série de audições. Primeiro, porque vai quem quer (e se quer), não estando vinculado a dizer a verdade. Depois, porque alguns dos convidados fazem da sessão uma festa - oportunidade para show off televisivo ou para a exposição de pequenas e médias vaidades - enquanto outros se escudam em razões legais para manter a boca convenientemente fechada (quando muito, apenas aberta para dizerem o que lhes convém, assim produzindo exactamente o mesmo resultado).
Servem as audições - e prometem continuar a servir - para o "bate-boca", especialmente vivo entre o partido que apoia o Governo e o que sonha ocupar-lhe o lugar. Não é nada de novo, mas neste escorregadio terreno torna-se uma faca de dois gumes.
A ânsia de pouparem Sócrates a danos maiores do que os já sofridos empurra os representantes do PS para uma estratégia quase exclusivamente defensiva. A ânsia de fustigarem Sócrates leva os do PSD a puxarem por uma corda que, na ponta oposta, pode muito bem chamuscar os seus.
Salta à vista que o arrastar das audições permite aos sociais-democratas manter acesa a chama das tentações intervencionistas do chefe do Governo nos média, desgastando-lhe a imagem. Mas como neste campo não há inocentes - talvez haja, isso sim, inocentes úteis - a ver vamos se o céu não lhes cai em cima...