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O presidente do Governo espanhol falou sobre Portugal. Falou uma, falou duas, falou três vezes, ninguém o cala. Mariano Rajoy deixou claro que está zangado com o que se passa em Portugal. Dizendo à sua maneira, "o que se passa em Portugal não me agrada". Ainda não perceberam? Mariano explica outra vez: "O que estou a ver em Portugal não me agrada". Mariano, aclare, por favor! Muito bem, mas é a última vez: "Não gosto do que se passou em Portugal".
Será isto uma ingerência nos nossos assuntos internos, por pouco soberanos que andemos? Aqui há uns anitos, seria. Agora, não. Devido à frequência e caráter repetitivo, em primeiro lugar. Hoje em dia, qualquer bicho-careta acha ter legitimidade para mandar os seus dichotes sobre o nosso país e, ao fim de algum tempo, já ninguém liga aos ralhetes. A segunda razão é de relevância: o impacto e a importância do que disse Mariano foram zero.
Mariano, o galego de Santiago de Compostela, talvez fizesse melhor em olhar para dentro de casa, e fazer jus ao lado muito térreo da sua profissão de origem, "registrador de la propiedad". No mínimo, pedia-se-lhe que velasse pela unidade da casa espanhola. No mínimo, tem sido medíocre na tarefa.
O resultado está à vista. Aproveitando de forma gulosa cada reação impante, petulante e arrogante de Mariano, os independentistas cresceram de uma forma inesperada. Por estes dias, a partir do Parlamento catalão, vão ensaiar a criação de uma República da Catalunha. E depois? E agora, Mariano?
Em vez de ceder em coisas pequenas assim se engrandecendo, Rajoy ameaçou, serviu-se do Tribunal Constitucional como arma, falou grosso e fez cara de mau. E conseguiu o contrário do que pretendia porque, de cada vez que quis assustar o "inimigo", engrossou-lhe as fileiras. Com eleições gerais em dezembro, sabe o quanto joga o seu futuro político, entalado entre catalães e urnas de voto.
No limite, é um facto, pode usar a arma atómica do art. 155 da Constituição espanhola, que prevê a suspensão da autonomia e ordens diretas a partir do Palácio do Governo, em Madrid. Mas que alguém lhe acuda se o fizer, porque demonstrará como é fraco. Mariano não é pequeno, mas nunca será grande. É mesmo o seu drama, ser peso médio quando seria preferível a agilidade inteligente do peso-pluma ou, em alternativa, a potência do peso-pesado.
*PROFESSOR UNIVERSITÁRIO