Não sei se é da época mas a notícia tem pouca margem para ser apenas uma simples notícia de Verão! Trata-se do péssimo sinal que dá a publicitada intenção do Governo em encetar uma política tendente a diminuir o património classificado.
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A imprensa não dá grandes pormenores mas claro que destaca o designado património material e, deste, o património construído, ou seja, o património arquitectónico.
Primeiro, porque, segundo depoimentos de alguns responsáveis governamentais, Portugal tem um grande número de edifícios classificados que é, muito provavelmente, exagerado! Serão, segundo consta dos arquivos, aí uns quatro ou cinco mil exemplares. Depois, porque Portugal tem um número indeterminado mas, mesmo assim, muito significativo, de edifícios (ou conjuntos edificados) em vias de classificação e cujos processos se encontram em curso há vários anos e em fases diferentes de avanço. Por fim, porque ultimamente se generalizou a tendência para o alargamento da lista com a proposição da classificação patrimonial de muitas outras situações para além dos edifícios como são, por exemplo, sítios, paisagens, actividades e achados da mais diversa natureza.
Claro que a classificação de algo como património, não se traduz na simples inclusão dessa coisa, numa honrosa lista de obras primas, raras ou mesmo únicas que, pelo simples facto de o serem, merecem o reconhecimento e o respeito de todos. Como é sabido, o estatuto de coisa classificada implica um significativo conjunto de consequências que vão desde o condicionamento ao uso e à intervenção de qualquer tipo como também um conjunto de outros condicionamentos em áreas envolventes. Claro que também não basta que a coisa classificada fique registada e com a sua área de influência definida, sendo necessário que, complementarmente, existam estruturas técnicas capazes de zelar por esse mesmo património, garantindo a sua preservação e conservação. Sob pena de irrelevância da acto de classificação e de toda a máquina que está associada ao processo.
Este é o procedimento que existe em todos os países com um mínimo de conhecimento e consideração pela sua história e, portanto, pela sua memória e, também, um mínimo de organização para que a sua vida não se esgote num dia a dia sem um antes nem um depois! Nestes termos, e em teoria, a tendência e o objectivo de qualquer povo ou país, será o da ampliação progressiva do seu próprio património e, sobretudo, do património classificado, ou seja, do património validado como valor e como factor de enriquecimento.
O que levará, então, o Estado Português, através do seu governo a não querer ampliar o seu acervo patrimonial e a querer mesmo reduzi-lo, abandonando ou deixando cair candidaturas em curso ou dificultando o já nada fácil processo de reconhecimento patrimonial que existe e que, inclusivamente, foi recentemente revisto? Claro que gerir um património vasto, tanto do ponto de vista dos meios humanos e organizativos que são necessários como do ponto de vista dos meio técnicos e financeiros que exige, é dispendioso. Claro que também não é a simples classificação que - como infelizmente se tem visto - serve de garantia para que o património se conserve. Claro que também não é fácil fazer com que, em vez de um obstáculo e de um peso, esse mesmo património se transforme num factor de desenvolvimento e, portanto, numa oportunidade de enriquecimeto.
Claro que nada disto é fácil! Mas numa época em que este tipo de valores - que são, exactamente, os valores de tipo patrimonial - são alguns dos mais sólidos suportes de actividades altamente rentáveis e com maior potencial de crescimento e a escalas nunca vistas como é o caso do turismo e, sobretudo, do turismo que assenta nas diferenças que são uma das mais fortes motivações para viajar, é estranho que haja um país que queria desfazer-se, exactamente, dos activos que suportam essas mesmas motivações. Ou será que os nossos governantes ainda não se deram conta de que é, exactamente nas áreas e nos locais onde o património - e, até do património internacionalmente reconhecido e classificado - é mais forte, que a actividade turística mais tem crescido e mais tem atenuado a chamada crise?
É que se a intenção dos gestores dos nossos bens patrimoniais, classificados ou não classificados - que vão muito para além de casas, cidades e sítios - é poupar, porque o tempo é de crise, é bem natural que, com remédios destes, a própria crise acabe mesmo por não nos poupar. O que seria trágico! É que há sinais que só o facto de serem dados… são mau sinal! E, este, é um deles. Veremos.