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As eleições de Espanha (23.7) podem causar retrocessos graves na “memória histórica”. Partido Popular e Vox já disseram querer anular as leis de “reparação” dos crimes franquistas. As famílias das vítimas temem o pior.
O tema provocou debates acesos no Parlamento. Apesar disso, as leis de 2007 (Governo de Zapatero) e de 2022 (Governo de Sanchez) passaram. São marcos fortes para associações de vítimas que recuperaram centenas de corpos de valas comuns.
A vitória de Franco na guerra civil (1936-39) foi conseguida à custa de fuzilamentos e barbaridades sobre partidários do regime democrático em vigor na altura. Número de vítimas controverso: 100 mil, 130 mil...…
Um dos fuzilamentos aconteceu em Badajoz. O jovem jornalista Mário Neves, do “Diário de Lisboa”, estava lá. Mercenários marroquinos e fuzilamentos saltaram para a primeira página.
O testemunho do jornalista foi um contributo importante para a história da ditadura de Franco. Após o 25 de Abril, Mário Neves publicou os textos censurados em livro: “A chacina de Badajoz”.
Os relatos, mesmo censurados, chegaram a Espanha. O pintor António Granados (1917-2020) contou-me um dia, em Madrid, como se lembrava do repórter: foi a ele que o comandante Yague falou dos fuzilamentos, “para não deixar os ‘inimigos’ nas costas, à medida que avançava para Madrid”.
Tinham passado 75 anos sobre o massacre e Granados, que escapara ao fuzilamento fugindo para a Venezuela, recordava-se bem. Mário Neves contara o que viu: corpos fuzilados nas ruas, fogueiras com centenas de corpos provocadas pela gasolina derramada sobre eles.
Nos primeiros anos de transição do franquismo para a democracia, após 1976, o tema dos fuzilamentos era tabu. Só 30 anos depois surge uma lei reparadora. Milhares de testemunhos. Descobrem-se centenas de valas comuns. Criam-se bases de dados. Muitos debates são desencadeados. Em Valladolid, 2012, um congresso - Jornalismo e Memória Histórica (organizado por Anson-Crespo) - torna-se exemplo a seguir.
Com a nova lei - Memória Democrática/2022 -, cabe ao Estado-Maior responsabilidade. De “revanchista” a “impulso democrático” ecoaram atributos nas “Cortes” (Parlamento).
A partir de domingo, riscos e medos. Sem justiça, que democracia terá Espanha?