Há uma nova ferramenta de captação de imagem que começa a ser explorada, aos poucos, pelos meios de comunicação social em todo o Mundo. Em Portugal, o recurso aos pequenos veículos aéreos não tripulados, os 'drones', tem-se multiplicado. No JN, por exemplo, temos vindo a captar e a publicar fotos e vídeos de ângulos inatingíveis pelos jornalistas ou operadores de imagem com o recurso a 'drones'. Foi assim que, desmontando a manipulação retórica dos números, mostramos a verdadeira dimensão de manifestações no Terreiro do Paço lisboeta no ano passado. Foi também dessa forma que revelamos uma visão alargada do acidente ferroviário ocorrido na última semana na Linha do Norte. Ou seja, usamos o 'drone' em casos de manifesto interesse público.
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O recurso ao "jornalismo drone" está, no entanto, longe de ser pacífico. Colocados em mãos de não--jornalistas, pessoas sem obrigações éticas e deontológicas, os 'drones' são um meio potencialmente eficaz em matéria de violação da privacidade. São, como alguém já lhes chamou um dia, a "ferramenta de sonho de qualquer paparazzo". Enquanto em Portugal esta discussão (e sobretudo a legislação) ainda se encontra adormecida, somos confrontados todas as semanas com um fenómeno muito nosso: o comentário 'drone'. E um peculiar protagonista: Luís Marques Mendes.
Voando baixinho, de gabinete em gabinete ministerial, o 'drone' em que se transformou o ex-líder do PSD revela-nos, via TVI24, decisões espantosas de um governo sem política de comunicação e, por isso, vulnerável.
Se assim não fosse, não teria sido o dito 'drone' a informar o país sobre o polémico relatório do FMI acerca da reforma do Estado antes de o documento ser conhecido do país e até mesmo, aparentemente, de alguns membros do Executivo de Passos Coelho. Ao não chamar a si efetivamente a comunicação política do Governo e ao rodear-se de uma equipa de assessoria de imprensa fantoche, o primeiro-ministro abre o espaço aéreo aos 'drones'. Ainda que, neste caso, só um pareça ter suficiente autonomia de voo.
É por isso que Marques Mendes cavalga, a cada semana, ora na existência de acordo na Concertação Social para a redução a prazo das indemnizações por despedimento para 12 dias (acordo negado pela UGT), ora na revelação de que os partidos da maioria iriam criar uma comissão parlamentar para debater a reforma do Estado. A tal que mereceu por parte dos partidos da Oposição o apelido de "comissão Mendes" mas que poderia muito bem ter sido batizada de "comissão drone".
Ao colocar-se em bicos de pés para, a cada intervenção, trazer ao país uma notícia surripiada de um qualquer gabinete, Mendes faz pela vida. Afinal, não se tratando de um filantropo, tem de mostrar serviço à frente das câmaras da TV. Não pode é, como ele próprio disse há tempos de Vítor Gaspar, "gozar com o pagode". Até porque, como no uso e abuso dos 'drones', a revelação descarada de informação governamental (que, mandaria a ética, deveria ser sigilosa) um dia ainda pode ser sujeita a legislação específica. Talvez quando acordarmos para ambos os fenómenos.