Mensagem de Marcelo Rebelo de Sousa no 137.º aniversário do JN
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Pela enésima vez, a dias de uma efeméride, Domingos de Andrade pede-me umas linhas.
A 2 de junho, claro, é mais um aniversário do “Jornal de Notícias”. Quer que eu fale de Portugal – 2030. Um esquema antigo, que é o de solicitar futurologia para depois de amanhã. Já fiz disso sobre Portugal 1980, 1990, 2000 e por aí adiante. E, como eu, dezenas ou centenas de analistas, politólogos, sociólogos, governantes, jornalistas, académicos e não académicos. Escreve-se. Uma meia dúzia lê, uns curiosos guardam para comparar e depois perdem os textos, a maioria ou não lê ou deita fora uns minutos volvidos. Portugal – 2030 é Portugal depois de amanhã. Amanhã, é o PRR, entre 2025 e 2026. Depois de amanhã, é o Portugal 2030. O primeiro com 7800 milhões no terreno e mais de 14 000 milhões por executar nesse terreno. O segundo, no início do início.
Entretanto, à nossa volta, a Ucrânia conhecerá, ao menos, semiepílogo quando? E o Médio Oriente? E o Sudão? E a guerra comercial? E a imprevisibilidade de não se respeitar regras, nem haver organizações internacionais que mandem, nem se entender quanto tempo e como os EUA, nesta versão, quererão substituir a aliança antiga com a Europa por simpatia pela Federação Russa e realismo negocial com o poder da China?
E muitas mais incógnitas sobre o novo ciclo europeu e os novos ciclos domésticos na Europa. Enfim, temas para analistas se debruçarem, infindavelmente. E um responsável político se pronunciar, se e como for caso disso, em momento adequado, e não, em pé de página entre a indigitação de um primeiro-ministro e a sua posse ou a uma semana do Dia Nacional. Eu sei que a voracidade comunicacional é, hoje, mil vezes maior do que ontem ou anteontem. Mas, por isso mesmo, dura cada vez menos, tal como influencia por ciclos cada vez mais fugazes.
Lembro-me de que uma prosa semanal do “Expresso” pesava mais e por mais tempo – mesmo no meio de uma revolução em permanente turbilhão –, do que um texto no “Semanário”, uns anos depois. E com um “Exame”, também semanal, na TSF acontecia o mesmo, por comparação com outras experiências radiofónicas. E a noite de domingo, na TVI, e até na RTP, tinha um eco várias vezes superior em 2000 a 2010 do que de 2010 a 2016, e, presumo, mais tarde, com a multiplicação de canais, programas, apontamentos, hora a hora, ao longo de dias.
Pelo menos, eu já sentia isso na fase final do meu quase-programa, suposto findar em maio de 2016, antes de, em outubro de 2015, ter iniciado a caminhada, perto do seu final. Tudo para dizer que o tempo e o espaço são outros. Tempo vertiginoso. Espaço globalizado, ainda que alguns o queiram negar ou dominar. 2030 é ao virar da próxima segunda esquina. E dependerá, decisivamente, por exemplo, do que suceder no Mundo, na Europa e em Portugal em 2025 e 2026. O mesmo para a Comunicação Social. A começar na nossa. A sua situação continua muito precária. Os paliativos não passam disso mesmo. Digo-o há mais de dez anos, todos os anos. Para imprensa, rádio e televisão. E panorama assim não é boa notícia para Democracia forte. E saudável. Talvez seja, por isso, sensato terminar, desejando ao “Jornal de Notícias” que continue a resistir, e a renovar-se, e a recriar o ser do Porto, dos Nortes e de Portugal. E a não ceder à tentação de olhar demais para os ciclos dos poderes estabelecidos. Eles eram muito longos há décadas. Duraram, alguns, mais do que se pensava. Mas, a ciência, a tecnologia, a volatilidade económica e a mobilidade social são crescentes. Façam o exercício de memória de recordar os grandes protagonistas económicos e políticos do salazarismo, do marcelismo, do cavaquismo, do guterrismo, do socialismo, dos quatro anos de Governo em troika, dos oito anos e meio findos há um ano, do ciclo então iniciado. Não perguntem nada a jovens ou conhecidos com menos de trinta ou quarenta anos. Desconhecerão quase tudo. Por isso, mais vale agir. Agir e, todos os dias, fazer o “Jornal de Notícias” mais sustentado, influente, capaz de criar novos futuros. Aí, o “Jornal de Notícias” – 2030 será outro e melhor. Se começar já, em 2025 e 2026.
E, caro Domingos de Andrade, se uma sugestão final é possível, convide, em 2026 e anos seguintes, além do presidente da República em funções, gente de 20 ou 30 anos para falar de como veem Portugal ou o “Jornal de Notícias” – 2040, 2050, 2060. O futuro é de todos. Mas será, sobretudo, deles.