Deitar as mãos à terra e trabalhá-la exige uma sabedoria infinita. É preciso conhecer com exatidão as características do terreno e as espécies que a ele se adaptam, entender os tempos certos para cada etapa, ter a paciência de esperar que a natureza faça o seu caminho e, sobretudo, saber como reagir quando a adversidade toma conta de tudo e ameaça deixar o vazio onde se esperava o fruto.
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Semear, mondar, podar, regar, colher: todo o ciclo exige tempo. Vivemos, pelo contrário, a ditadura do instante. Em que é normal que também nos fiquemos pela parte das metáforas, ouvindo a que mais nos convém. Colocando nomes nos ramos, sugerindo mudanças de árvore, procurando leituras rápidas onde se aconselha a reflexão e o trabalho consistente e persistente.
Uma das lições do Douro é que a excelência nasce de equilíbrios delicados. Entre herança e inovação. Entre a dureza dos sulcos e a delicadeza dos detalhes que moldam os sabores aperfeiçoados sem cessar. Entre a profundidade absoluta, quase solidão, e a vontade de fazer chegar o que se cria a qualquer país ou território. Entre a interioridade e o mundo de portas abertas. Entre o saber de experiência feito e o conhecimento adquirido nos laboratórios e universidades.
Não basta falar de coesão, de persistência, de criação de valor. Construir um país que seja mais e melhor exige levar a sério as metáforas. A vinha é sangue, suor e lágrimas. Em anos de má colheita, é esperança no ciclo que se segue, porque a natureza regenera-se e renova-se sem esperar que cuidem dela. Na bipolaridade típica de ser português, facilmente nos esquecemos que não somos os melhores do mundo, nem os piores. Somos parte das soluções, se quisermos procurá-las e dar o nosso contributo, em vez de assumirmos o discurso permanente de velhos do Restelo.
*Diretora