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Em fevereiro passado, a Metro do Porto apresentou a sua proposta para a extensão da rede existente que, como se ficou a saber, contempla dois percursos: um no Porto e outro em Gaia. Ao que, então, se soube, a proposta obteve o acordo da Junta Metropolitana e, portanto, dos seus 17 municípios. Claro que alguns devem ter sentido algum desconforto, mas, enfim, é a vida!
De acordo com as (escassas) explicações dadas, a escolha, para o Porto, recaiu na ligação entre uma nova estação junto da existente na Casa da Música e uma outra, igualmente nova, na Praça da Liberdade, junto a S. Bento. A decisão terá resultado de dois fatores considerados decisivos pela Metro: a verba disponibilizada pelo Governo (cerca de 290 milhões de euros) e um estudo dito "de procura" que apontava para cerca de mais 30 mil utentes por dia nas duas linhas (28 mil no Porto e cinco mil em Gaia). Ou seja: a questão foi apresentada como sendo a de saber o que é que a Metro podia fazer com aquele dinheiro e se o "negócio" valia a pena. A conclusão foi a de que se podiam fazer três quilómetros de linha no Porto e outros tantos em Gaia e a coisa podia bater certa. Sobre se é isto que a cidade precisa, muito pouco ou nada foi dito! A verdade é que, quatro meses passados, nada mais se soube e o "site" (que é o "sítio" por onde parece que toda a democracia passou a passar) nada mais acrescenta. Quer isto dizer que está tudo bem, que não há mais perguntas a fazer nem dúvidas a esclarecer? Não. E as dúvidas até são muitas! Assim:
A Metro do Porto sabe que rede quer construir e, ainda que o seu desenho tenha sofrido alterações ao longo do tempo, tem, certamente, uma ideia - estruturada - da rede mais ampla, mais abrangente e mais multimodal, com a qual não pode deixar de colaborar. A verdade é que, com a proposta agora apresentada, isso já não é assim tão claro!
De facto, olhando para o "projeto" da referida rede, não se encontra onde e como encaixar o que agora é proposto. Nem em termos de traçado, nem em termos de número e localização de estações. Com efeito, o último documento que se conhece data de 2010 e, nele, está desenhada, com detalhe e fundamento, a chamada Linha do Campo Alegre, que seria a primeira extensão. Está, então, nesse documento, algo que se pareça com a "linha" que agora é apresentada? A resposta é... não. Quer isto dizer que há, portanto, matéria nova e que algo deve ter mudado na cidade, na AMP, na Metro ou em todos ao mesmo tempo (incluindo no Governo), para que o que não estava, sequer, sugerido, em 2010, seja agora proposto com tanta certeza! Será que o dito estudo, "de procura", revelou uma cidade que não existia há seis de anos e que a cidade consolidada que tínhamos, afinal, se "desconsolidou" subitamente?
Ou seja: em 2010, já havia o Polo Universitário do Campo Alegre, com três grandes faculdades e outras importantes valências universitárias, como laboratórios, museus, residências, Planetário, Teatro e Estádio Universitário, a CCDRN e outros equipamentos importantes; o polo do Palácio de Cristal, com os seus jardins, o Pavilhão Rosa Mota, a Biblioteca Almeida Garrett e o Museu Romântico e mais duas faculdades da UP (Biomédicas e Farmácia), a Consulta Externa do Hospital de Santo António, o Seminário de Vilar, o Museu Soares dos Reis e as Galerias da Miguel Bombarda; como também já havia o polo da Cordoaria, com o Palácio da Justiça, a Reitoria, a Cadeia da Relação, o Mosteiro de S. Bento da Vitória, a Árvore, o Piolho e a Lello, e até a movida começava já por ali!
Então, se tudo isto já existia e se nada, entretanto, desapareceu e, antes pelo contrário, até se reforçou e com muitos milhares de utentes, porque é que agora se privilegiam os quase vazios da Praça da Galiza (com, quando muito, duas escolas com 600 alunos e o CMIN) e do Jardim do Carregal (com o Hospital e a Morgue)?
E tudo para já nem, sequer, falar da proximidade física dos potentes polos do Palácio e da Cordoaria (que a Galiza e o Carregal não têm) aos percursos assistidos entre a Marginal do Douro (Alfândega/ Virtudes, Palácio e Polo Universitário e, até, o Bom Sucesso) que, com a atual proposta, terão mesmo de esperar que, um dia (muito longínquo) o Metro do Campo Alegre lhes... sorria!
*ARQUITETO E VEREADOR DA CM DO PORTO