"É desejável que os combustíveis que nós usamos nos nossos carros baixem o mais rapidamente possível". "Há alguma carga especulativa feita pelas petrolíferas internacionais". "Há uma relação bastante próxima, mas não coincidente entre os preços do petróleo e os preços dos produtos.
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Este efeito pode não ser no dia seguinte, mas acredito que seria totalmente anormal se esta tendência não se reflectisse". Quem tais declarações proferiu não foi um analista do mercado petrolífero; foi o ministro Manuel Pinho. Assim formulada a questão -pelo titular da pasta da Economia - poderiam os mais distraídos cidadãos supor que se tratava de um sinal. Que estava a ser preparada uma intervenção, caso a acentuada quebra do preço do crude nos mercados internacionais não se reflectisse no da gasolina e do gasóleo. Pura ilusão, se analisada a sua margem de manobra neste domínio.
O Governo - Pinho sabe-o melhor do que ninguém - não está em condições de meter prego nem estopa num mercado liberalizado. A Autoridade da Concorrência, uma entidade independente, pode e deve regular o sector, verificar se há violação das regras, apertar a vigilância sobre eventuais práticas de concertação de preços entre as empresas. Daí à imposição administrativa de preços vai um passo de gigante. Discorde-se ou não, foi esse o caminho há anos traçado. Não consta que o Governo PS esteja disponível para mudar uma vírgula que seja na arquitectura do sistema. Menos ainda estará para levar um puxão de orelhas de Bruxelas, se se atrever a fazê-lo.
O que resta, então? Dito de outra forma: que efeito tem o que disse o ministro da Economia, a não ser a expressão de um desejo, do tipo "era fixe que gastássemos menos em gasolina", que qualquer um de nós também formula? Objectivamente, as declarações não aquecem nem arrefecem. Sendo proferidas por um ministro, só pode concluir-se que mais valia ter permanecido calado.
Foi mais ou menos isso que sugeriu o secretário-geral da Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas, instado a comentar as afirmações. Sem preocupações de moderação verbal, José Horta atirou a Pinho uma mão cheia de setas certeiras: "Creio que o verbo usado pelo senhor ministro foi 'desejava que os preços descessem'. Falou mais como intérprete dos desejos dos consumidores do que propriamente como governante responsável pelas políticas energéticas".
Já não seria pouco este raspanete a um ministro que, se bem interpreto as observações de Horta, ousa meter-se onde não é chamado. Sucede que Manuel Pinho ainda teve de passar pela "vergonha" de ser, digamos assim, olimpicamente ignorado. A BP decidiu aumentar o preço da gasolina em um cêntimo. Como quem diz: "Toma lá, que já almoçaste".