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Nos Campos do Mondego, desde há séculos, o seu castelo é guardião contra as investidas que surgissem dos lados do mar. Por um dia, deixei a pátria tripeira e regressei à outra pátria, em terras de Montemor. E encontrei a ponte entre o passado e o futuro.
A vila antiga permanece adormecida na brancura da sua identidade. Mas as novas ruas desfizeram o cancro da velha estrada da Figueira. Enquanto isso, a vila em expansão vai sendo construída sem interferir com os séculos de património acumulado.
E, além da excelente reabilitação da Igreja gótica da Misericórdia, de um Centro Interpretativo e outras novidades, somos brindados com escadas rolantes que levam da vila baixa à sua referência: o castelo. Foi outro espanto: os seus espaços encontram-se cuidados, como nunca vi. Mas havia mais, na surpresa dos painéis de um percurso com a “Rota Literária de Afonso Duarte”. Finalmente, um dos grandes poetas portugueses, politicamente desterrado na quase-ilha da Ereira, esquecido pelo provincianismo de certa pós-modernidade, recebe, da sua terra, a justa homenagem.
A ele devemos poemas inesquecíveis: "De cá saiu o Fernão Mendes Pinto, / Saiu de cá o Jorge Montemor. / Só eu fiquei por guardador / Da Vila morta, e de um mar extinto". Ou este, de 1949, e actual: "Eu cá mesmo no extremo Ocidental / Du-ma Europa em farrapos, eu / Quero ser europeu: Quero ser europeu / Num canto qualquer de Portugal". E um epigrama, de 1952, ainda mais actual: "Política? O prejuízo / É contemporizar com toda a besta: / Eu quero a pessoa honesta / E não contemporizo". Eis a dignidade dos Campos do Mondego.
(O autor escreve segundo a antiga ortografia)