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O director-geral da PJ concedeu, recentemente, uma entrevista na qual terá dito que na criminalidade económico-financeira os advogados exercem "terrorismo jurídico" com o objectivo de protelar a conclusão dos processos. Verbalizou, afinal, o pensamento de muitos profissionais do foro e não só.
Os advogados não gostaram, alguns pronunciaram-se publicamente, manifestando o seu desagrado, e o bastonário da Ordem dos Advogados determinou a instauração de um processo disciplinar, pois, aquele mantém activa a sua inscrição naquela Ordem. Entendo o desabafo do director-geral, sendo ele uma pessoa que dedicou a maior parte da sua vida a combater o crime, é compreensível um certo sentimento de frustração quando os processos se prolongam, parece que indefinidamente. Certo é que os advogados delineiam as estratégias de defesa no âmbito e de acordo com o que a lei lhes permite.
Embora seja defensora acérrima dos direitos do arguido, reconheço no Código do Processo Penal normas demasiado garantísticas e condescendentes com práticas dilatórias. Ao arguido deve garantir-se todos os meios de defesa, de acordo com a CRP e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, conquista do direito humanista que devemos preservar. Mas os abusos não devem ser permitidos e haverá que sancioná-los para que não desvirtuem os direitos fundamentais não só daquele, mas também das vítimas e da paz jurídica. Partilho a preocupação, que é a de todos os cidadãos, com a demora excessiva na conclusão de alguns processos e na co-responsabilidade de alguns advogados nesta situação.
A maioria da criminalidade é resolvida em tempo aceitável. Outra realidade é a dos crimes económico-financeiros, apelidados na gíria judiciária "de colarinho branco", praticados por aqueles a quem se chama "ricos e poderosos", pela sua influência política, social, económica ou financeira. Neste âmbito, a actuação criminosa é sofisticada, a fachada dos negócios, das empresas e das sociedades é aparentemente irrepreensível, mas alicerçada num mundo subterrâneo de crimes que lesam, sobretudo, o Estado e a comunidade.
Na fase da investigação, na qual os advogados pouco intervêm, a razão fundamental da demora é a falta de meios humanos, sobretudo de peritos nas várias áreas do saber que interceptam este tipo de crimes. Ainda agora, foram nomeados cerca de 18 peritos para assistir tecnicamente o MP, número insuficiente para fazer face à complexidade de processos como o do Furacão, Monte Branco, BPN, BES, Marquês...
Nas fases de instrução e julgamento, a par daquela carência, entra em cena a "engenharia" de alguns advogados na construção da defesa. Cumprem o seu papel, que lhes é permitido pelo facilitismo de algumas normas processuais. Torna-se necessário, em minha opinião, uma intervenção cirúrgica no CPP, retirando das suas normas aquelas que permitam uma actuação dilatória e que não contenda com os direitos fundamentais dos arguidos e das vítimas.
*Ex-diretora do DCIAP
(A autora escreve segundo a antiga ortografia)