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Morreu Catarina de Albuquerque. Tinha 55 anos e era uma das melhores portuguesas. Os seus dois filhos talvez possam ter algumas dúvidas, afinal nem todos os telejornais a incluíram no alinhamento. Tem a ver com o tempo lá fora. Um breu que nos obriga a andar como se jogássemos à cabra-cega, deixámos de conseguir distinguir um rio límpido de um charco putrefacto. Catarina era a maior especialista das Nações Unidas nos assuntos ligados à água e à sua escassez. O trabalho que fez foi decisivo para que milhões de pessoas tivessem acesso a água potável e a saneamento básico. Não sei se algum português vivo teve tanto impacto global como Catarina de Albuquerque, que morreu quase incógnita, na passada terça-feira. Era uma mulher maravilhosa. Difícil não nos apaixonarmos pelo seu modo luminoso de viver, de contar estórias, de se recordar de pessoas concretas, de meninos com nome e apelido que a abraçavam em África, na América Latina, nos lugares mais inóspitos onde chegava com o sorriso que lhe vinha dos olhos. Era portuguesa, mas parecia de todas as cores e de todos os países, falava muitas línguas, também falava com as mãos e com uma eloquência lendária nos corredores da ONU. Trocámos imensas mensagens, ficámos de conversar mais, de criar projetos. Não aconteceu como desejávamos. Sinceramente, não percebo como uma pessoa assim pode morrer tão jovem. Tão incrivelmente luminosa. Tão tocada pelo Bem, por uma ideia de Bem. Como se explica que tanta luz não seja suficiente para estancar a escuridão?