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Os senhores deputados da nação parecem não ter emenda. Como a vida custa a todos, estão genericamente transformados em marionetas dos chefes dos partidos políticos. São incapazes de um mero esboço de independência de raciocínio; em certas ocasiões parecem até viver com umas palas idênticas às usadas por certos quadrúpedes. Valem-se de um sistema político hermético, em circuito fechado, para fazerem de conta que não percebem como o povo está cada vez mais farto do esquema.
As consequências das eleições autárquicas do último domingo são paradigmáticas da tristeza de espírito vigente. Em vez de procederem a uma análise, até sociológica, das razões subjacentes aos resultados obtidos, quer pelas hostes partidárias quer por independentes de verdade e outros como tal confundidos, os senhores parlamentares dedicam-se à troca de acusações numa chicana política intolerável. Espetam mais uns pregos no caixão da sua credibilidade.
O plenário da Assembleia da República foi ontem o exemplo acabado de como o país está entregue aos bichos. Os parlamentares fixaram-se em trincheiras em tudo semelhantes àquelas a que se confinam algumas claques ligadas ao mundo do futebol. Sim, não culpabilizaram o árbitro - era o que mais faltava! - mas foram incapazes de dar a mão à palmatória no que quer que seja ou, inclusive, de lançar pistas para melhorar os seus índices de credibilidade ao ponto de inverterem em próximos atos a avassaladora percentagem de abstenção e votos nulos. Fizeram pior: ginasticaram as leituras consoante as conveniências. Continuam, enfim, sem perceber a incapacidade de que dispõem para passar atestados de menoridade a um eleitorado farto de ser enganado e, pior, causticado pela falta de seriedade.
No redondel continuarão, naturalmente, a esboçar-se golpes mais ou menos palacianos. O olfato apurado de alguns indica-lhes a séria possibilidade de retoma do Poder a curtíssimo prazo; o esforço de sobrevivência de outros ativa estratégias, ora tentando neutralizar um movimento de caça às bruxas de que foram vítimas, ora branqueando derrotas e novas dificuldades ao dobrar da esquina - pois, a "pen" com o Orçamento do Estado de 2014 tem de ser entregue até 15 deste mês e segue-se um novo festival de falta de decoro no Parlamento entre o dia 23 de outubro e a votação global apontada para 26 de novembro.
O país, enfim, merece melhor. Não vai lá pela sistemática mudança de tralha nos gabinetes do pessoal político - de governantes a deputados, de vereadores a ASPONE (Assessores de Porra Nenhuma!). Mais cedo do que tarde, impõe-se mudar esta República.