São múltiplos os sintomas e unânimes os diagnósticos: a Direita portuguesa vive num dilema profundo, que é o de saber até onde está disposta a sacrificar os seus valores liberais, humanistas e democráticos para garantir um regresso ao poder.
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Podemos discutir a forma, o estilo mais eficaz, a lógica de coligações e de cedências aritméticas, mas o que falta verdadeiramente - e voltamos a não ter um vislumbre dessa preocupação no encontro do Movimento Europa e Liberdade (MEL) - é um programa político alternativo ao PS e à Esquerda. Um propósito junto dos eleitores, uma narrativa válida, um modelo de desenvolvimento do país, e não apenas uma agenda maniqueísta centrada na reforma da Justiça, na diabolização da Comunicação Social e de outras temáticas que podem ser certamente importantes no basfond dos gabinetes, mas não mobilizam ninguém. Quanto maior for esse vazio orientador, mais foguetes lançarão André Ventura e o Chega. Porque de pouco ou nada dependem do conteúdo e das ideias. A sua estratégia assenta no ruído das redes e nos títulos chocantes dos jornais. É assim que vão continuar a crescer.
Mas uma Direita em frangalhos não é apenas um problema da Direita. Portugal precisa de alternância democrática. O país não se esgota num modelo de partido único como aquele a que temos vindo a assistir nos últimos anos com o PS. Virá o Messias? E há um Messias?
No auditório do MEL, Pedro Passos Coelho assistiu a tudo de cadeirinha, marcou terreno, deu prova de vida política. Mesmo sem ter dito nada. Não precisa. Mas, tragicamente para a Direita, este ainda não é o momento do ex-primeiro-ministro. Porque não sendo ele o tal Messias que tantos saudosos proclamam, é a única figura que verdadeiramente consegue agregar, e domesticar, as várias direitas que se digladiam na arena. E é sobretudo o único cujo silêncio constitui capital político acumulado. Mas Passos, que governou o país num contexto de enorme dificuldade, não quererá regressar para vestir a mesma armadura política. Passos vai querer governar num ciclo de crescimento, sem amarras. Que Direita vai encontrar quando, e se, der esse sinal, é a pergunta sacramental. Até lá, continuará cada um a puxar para o seu lado. Muita fome, pouco foco.
Diretor-adjunto