Outrora não votavam apenas porque eram mulheres. No início do "Estado Novo", em 1933, uma minoria passou a poder votar se tivesse o Ensino Secundário ou um curso especial.
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Mais tarde, em 1946, o voto foi alargado às mulheres que, sendo chefes de família, tivessem rendimentos ou soubessem ler e escrever. A partir de 1969, bastava que não fossem analfabetas. Só com o sufrágio universal em 1975, as mulheres obtiveram a igualdade política com os homens.
Por estranho que isso possa parecer, embora de forma disfarçada, a antiga dualidade de critérios, essa obrigação feminina de provar o mérito, esse ónus adicional que recai sobre as mulheres, continua a existir entre nós e pelo Mundo, sempre que são candidatas a um qualquer lugar de direção em instituições públicas e privadas. No caso masculino, o mérito é quase sempre evidente; no caso feminino, há quase sempre um qualquer senão.
Tem sido assim na discussão recente sobre a eleição do/a presidente da Assembleia da República. Como escreveu Isabel Moreira no "Expresso" ("Não é a Edite Estrela, Somos Nós"), não importa os nomes que estão em causa, seguramente duas pessoas com currículo mais do que suficiente e mérito qualificado para ocupar o lugar. O que interessa e o que nos deve fazer refletir é a tentativa de desqualificação de uma eventual presidência feminina do Parlamento.
É esta história que se repete muitas vezes.
No outro dia, estávamos a discutir as quotas para os cargos de direção das empresas, uma diretiva europeia que só foi desbloqueada ao fim de 10 anos e que tem finalmente condições para vir a ser aprovada. No debate, surgiu de imediato a objeção habitual: então isso não vai tirar o lugar a muitos homens com mérito? A pergunta tem logo um pressuposto - o de que mulheres sem mérito vão ocupar os lugares que seriam predestinados a homens cheios dele.
Contudo, o que vemos atualmente quando abrimos um qualquer concurso exigente em matéria de qualificações é que, em geral, as mulheres ficam à frente. É assim, por exemplo, na magistratura, profissão interdita às mulheres até ao 25 de Abril de 1974, mas hoje com maioria de mulheres, como é assim em muitos outros concursos onde o dito mérito é julgado objetivamente e é o único critério de acesso.
É mesmo nestas alturas que me ocorre uma frase muito inspiradora, atribuída a uma sufragista norte-americana, segundo a qual o Mundo só será justo e igualitário quando houver tantas mulheres incompetentes em cargos de direção como os homens que atualmente lá estão.
*Eurodeputada do PS