Se Lula da Silva não tivesse tido uma broncopneumonia, a sua viagem à China já teria acontecido e, decerto, provocado muitas reações. Assim, a deslocação ficou adiada, procurando-se agora remarcar a visita a partir de 11 de abril. No entanto, a expectativa mantém-se. E as reservas de Washington também.
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Sendo acompanhado por uma numerosa comitiva, onde se contam 200 empresários, o presidente brasileiro procurou enquadrar essa opção num quadro que tem a China como um dos principais parceiros comerciais do seu país. Todavia, num contexto de tensão entre Joe Biden e Xi Jinping, é inevitável comparar esta deslocação de vários dias com aquela que Lula fez, em apenas um dia, em fevereiro, aos EUA. Com o presidente americano, houve somente uma conversa sobre a preservação da democracia e do meio ambiente, sem que tivesse havido, por exemplo, qualquer anúncio concreto de apoio ao "Fundo Amazônia", o que, de acordo com a edição desta semana da revista brasileira "Isto É", "frustrou a delegação brasileira".
Nesta sua terceira viagem à China, Lula da Silva prevê a assinatura de 20 acordos em diversas áreas. Os média brasileiros destacam a parceria que será promovida para a construção e lançamento de um novo satélite sino-brasileiro; as alianças com a indústria automobilística (sobretudo no setor elétrico); e a visita em Xangai à fábrica do gigante tecnológico Huawei, iniciativas que suscitam profundas desconfianças nos EUA. Recorde-se, por exemplo, que a multinacional chinesa tem sido reiteradamente acusada pelos americanos de espionagem...
Nesta sua preenchida agenda diplomática, Xi Jinping vai ganhando fôlego à escala global. Antes de receber o presidente brasileiro, centra a sua atenção na Europa. Depois de ter recebido Pedro Sánchez, prepara-se para abrir sucessivamente portas a Emmanuel Macron, a Ursula von der Leyen e a Josep Borrell, reclamando, assim, para Oriente um inequívoco protagonismo no palco geopolítico. Ainda há duas semanas, a revista "The Economist" anunciava em capa "um mundo segundo o presidente da China", assegurando que Jinping pretende refazer a ordem mundial assente em acordos estratégicos com determinadas potências, jogando todo o seu peso comercial para influenciar o tabuleiro político onde mexe com mestria cada peça.
Assim, para lá do relato aparentemente benigno que os média fazem das visitas de Estado que decorrem agora tendo Jinping como anfitrião, impõe-se uma leitura mais sistémica e de longo prazo. É preciso perceber que se joga aqui um (des)equilíbrio entre EUA e China. E isso não será neutro para o resto do Mundo.
Prof. associada com agregação da UMinho