Ficará este domingo na história da Europa? Se sim, será pelas boas ou más razões? Os ingredientes estão todos lá.
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A Grécia terá dado o último passo no seu harakiri. Com o crescimento dos movimentos extremistas e o colapso dos partidos centristas, não será fácil conseguir pôr de pé e, menos ainda, garantir a estabilidade de um governo de salvação nacional. Dir-se-ia que os gregos escolheram sair do euro. Perante estes resultados, os principais dirigentes europeus não podem encolher os ombros com indiferença tecnocrática. Ou podem? Com a derrota de Sarkozy, por pouco que seja o mérito de Hollande e a sua capacidade de cumprir o prometido, algo me diz que a postura será diferente. Numa perspectiva nacional, é importante que assim seja: se a Grécia entrar em convulsão, por mais bem comportados que estejamos a ser, somos os próximos na lista. Seríamos afectados e infectados.
Tudo somado, talvez os resultados não tenham sido maus: um apoio à manutenção da Grécia no euro e uma maior atenção ao tema do crescimento ou, pelo menos, aos impactos negativos da política de austeridade, na forma como tem sido prosseguida, podem vir a permitir-nos respirar um pouco melhor, a ganhar algum tempo, a recuperar esperança. O maior protagonismo de Prodi e as suas propostas para que Itália, França e Espanha concertem acções são, igualmente, positivos. Se a isto juntarmos que as eleições locais não correram de feição a Merkel, podendo ser um prelúdio para as eleições do próximo domingo na populosa e marcante Renânia do Norte - Vestefália, começa-se a compor um pano de fundo que talvez force os líderes europeus a mexerem-se e não apenas a reagirem.
Numa fase de desorientação do Governo, estas são boas notícias. Preso a uma cartilha liberal mecanicista, o Executivo tem-se fartado de dar tiros nos pés, incapaz de fazer a ponte entre o prescrito e a realidade. As declarações de Passos Coelho, no 1º de Maio são elucidativas: anuncia que temos de nos preparar para níveis de desemprego a que não estávamos habituados, quando as pessoas esperariam dele que lhes dissesse, pelo menos, o que o Governo estaria a pensar fazer para tornar o convívio com essa situação menos penoso e penalizador, sobretudo para os mais desfavorecidos. Pode não vir nos manuais mas, a Grécia aí está para o provar, a manutenção de um nível mínimo de coesão social é, em democracia, pré-condição para o sucesso de qualquer política de austeridade. É esta capacidade de ler, e se ajustar, às condições concretas que se espera dum político sob pena de, regido pelo fundamentalismo, hipotecar o... fundamental.
Portugal tem de ganhar potencial de desenvolvimento. Projectando uma evolução na continuidade, um estudo recente estima que conseguiríamos crescer, até 2030, a uma média de cerca de 2% ao ano, manifestamente insuficiente para fazer face às nossas obrigações e melhorar o nosso nível de vida. Os défices são mais consequência do baixo crescimento do que gastos excessivos. Precisamos de uma mudança estrutural, da qual as reformas são parte mas que não se esgota nelas. É imperioso alterar o que produzimos e como o fazemos. Melhorar e diversificar a produção e a exportação, evoluindo para actividades mais produtivas e mais bem remuneradas. A produtividade é uma variável crítica neste processo: a única maneira de reduzir consistentemente o desemprego é criar empregos que passem o teste do mercado e, para isso, é preciso que sejam produtivos. Critério tanto mais relevante quanto mais forte é a evidência sobre o papel primordial que as exportações têm nas perspectivas de crescimento de uma economia. Acontece que os mercados internacionais não se regem por simpatias. Crescem mais depressa os países que têm um perfil exportador mais sofisticado, o que resulta de um processo em que se vão acumulando competências cada vez mais complexas, o que requer persistência no caminho traçado e os incentivos adequados. Traduzindo: política e políticas. Na vida real, os caminhos para o mercado nem sempre vêm nos livros.