O Governo português continua a sua saga de tornar credível o propósito de controlo do défice e redução da dívida pública. Às medidas de austeridade sucedem-se, agora, estímulos ao crescimento e à competitividade. Sem aumentarmos a riqueza produzida não há, a médio prazo, estratégia de consolidação orçamental que resista. As intenções anunciadas são correctas no plano dos princípios e na prioridade às exportações. Ainda vagas, a sua eficácia dependerá dos malditos detalhes. Algo tardias, tomadas mais por coacção do que por convicção. Talvez por isso não tenham (ainda?) impressionado os sacrossantos mercados, conquanto (meio caminho andado?) tenham merecido os elogios de Angela Merkel.
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No seu anúncio, o executivo falou de incentivos e de custos de contexto. O conjunto de regras e instituições que enquadram a actividade económica portuguesa está longe de ser exemplar. Temos normas e regulamentos a mais e concorrência a menos, o que penaliza as empresas. Ao mesmo tempo, ninguém com um mínimo de conhecimento da realidade empresarial internacional poderá atribuir a essas circunstâncias a falta de dinâmica e de capacidade para competir manifestada pela iniciativa privada em Portugal. Se esse fosse o grande empecilho, teríamos assistido a processos de internacionalização para países mais liberais e não, como acontece, para países parecidos, para pior, com o nosso.
Aliviar esses custos, não resolve mas ajuda. Nesta conjuntura, até os pormenores adquirem importância. Desenganem-se, porém, os que pensam que, com mais estas medidas, o governo teria retirado o álibi aos empresários portugueses. "Português" é, aqui, a palavra-chave. Enquanto tal, continuarão a encontrar fora da empresa, nos outros, a justificação para os seus problemas ou insucessos. Quando já não for a geografia, a burocracia, a legislação laboral, a fiscalidade, as portagens, serão os custos dos combustíveis, das matérias-primas, da electricidade, das comunicações. A produtividade, medida em volume ou quantidade, que pouco depende de tudo isso, pode ser muito baixa, em comparação com os outros países. Nada obsta a que a ladainha persista.
Alguns dos custos de contexto são imputados a sectores regulados, como a electricidade ou as telecomunicações. Em resposta, as empresas abrangidas apresentam números que desmentem a acusação. Ninguém é bom juiz em causa própria. As entidades reguladoras poderiam, e deveriam, ser mais activas na pedagogia e no esclarecimento. O seu silêncio permite que a ambiguidade persista. Mais do que ensurdecedor é comprometedor.
O quadro traçado é excessivo. Há hoje um número cada vez maior de empresas, de todas as dimensões, que não procuram desculpas e se fazem à vida. Aceitam o jogo concorrencial e preparam-se para o disputar. Um dos aspectos mais trágicos do tal contexto é que, não poucas vezes, são estas as primeiras vítimas, abatidas nos caminhos tortuosos que a burocracia e a lentidão da justiça tecem. Mais transparência e decisões judiciais mais céleres precisam-se. Por mais voltas que dêmos, acabamos sempre no sistema de justiça, a verdadeira prioridade estrutural. E, quanto a isso, não há nada de novo!