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A crise política em Portugal não termina – apenas muda de feitio. A eleição recente, que muitos esperavam ser um ponto de viragem, revelou-se apenas mais um capítulo na novela da instabilidade. A Direita venceu, sim, mas não governa com folga. O PSD, sozinho no meio do vendaval institucional, enfrenta um Parlamento hostil e uma sociedade desconfiada. Sem maioria nem coligações sólidas, cada iniciativa legislativa será um campo minado. E assim, o país segue parado.
Na Oposição, o Chega ocupa o palco com talento dramático. André Ventura não propõe soluções, mas expõe as feridas do regime. Com uma bancada robusta e cada vez mais afiada no uso mediático da indignação, o partido ganhou o estatuto de grande escrutinador dos podres da república. A cada escândalo, a cada hesitação do Governo, Ventura cresce – não pelas respostas que dá, mas pelas perguntas que sabe fazer em voz alta. Ele continuará neste registo até que o povo, cansado do ensaio geral, o convoque para protagonizar o espetáculo principal.
Enquanto isso, o PS recolhe-se. Derrotado, tenta reorganizar-se longe dos holofotes. Há quem fale de renovação, mas o que se vê é silêncio – e ausência. O partido que dominou o centro político nas últimas décadas deixou um vazio que nem o Livre, com a sua agenda generosa, nem a Iniciativa Liberal, com a sua retórica de eficiência, conseguem preencher. Ambos crescem, mas não disputam o poder – são notas dissonantes numa sinfonia sem maestro.
O país continua, portanto, em modo suspenso. A governabilidade está refém da matemática parlamentar e da ausência de uma visão mobilizadora. E a cada dia que passa, ganha corpo a ideia de que não basta mudar o Governo para mudar o país. Com esta configuração, com este sistema, com estes protagonistas – simplesmente, não chega. Só falta o Chega chegar.