Já não presto muita atenção à omnipresença do sr. presidente da República. Na linha do seu antecessor, mas de forma mais animada e mais física, insiste numa magistratura de influência a chamar a atenção para temas, para terras, para pessoas, para estratégias, para factos e para esperanças.
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Tudo abraça com a mesma velocidade e com a mesma aparente convicção. Passo os olhos e gosto de o ver feliz. Mas não me lembrava de o ver repetir um tema.
Até que reparei no que está a tentar fazer pelos sem-abrigo. Reparei porque o presidente não larga o tema. Chamou a atenção do Governo no ano passado e voltou a fazê-lo esta semana, alertando, exigindo resultados e impondo metas.
Pelo meio, visitou pessoas entregues à rua, instituições que as acolhem por umas horas e juntou uma série de organizações que se dedicam, das formas mais variadas, a tentar perceber um problema tão complexo como profundamente solitário.
E é precisamente esta complexidade que obriga a uma atuação persistente e corajosa. As situações que levam pessoas a viver e/ou a persistir na rua são muito diferenciadas e exigem uma coordenação de esforços detalhada, inteligente, abnegada e criativa.
Voluntarismo, planeamento assético, reutilização de respostas sociais já existentes, pura e simplesmente não funcionam. A solidão, as defesas, o medo e as muletas que acompanham cada mulher e cada homem que está na rua têm de ser conhecidas, reconhecidas e tomadas em absoluta consideração antes de qualquer esforço de reintegração.
Apesar de não haver estatísticas oficiais (que eu conheça), estima-se que existam mais de 4000 pessoas nesta condição, o que a torna numa verdadeira calamidade que temos obrigação de resolver.
Com a vantagem de podermos aprender o mais difícil: coordenar esforços e otimizar meios com criatividade e, sobretudo, com atenta humanidade.
Não presto muita atenção ao constante vaivém do sr. presidente.
Seria fácil manter-se no registo positivo que os números têm permitido e evitar um tema cru e incómodo.
Mas, tenho para mim que neste caso está sincera e persistentemente empenhado. A energia e a rede de que dispõe podem fazer o resto.
Julgo que todos os portugueses lhe pedirão que não desista!
* ANALISTA FINANCEIRA
